Uma leitura atenta ao livro do Historiador Laurentino Gomes, publicado pela editora Globolivros em 2019, é impossível não opinar, questionar e tomar partido desta temática tão cruel com desdobramentos até nos dias atuais.
Para o autor: “A escravidão é um fenômeno tão antigo quanto a própria história da humanidade. No mundo inteiro, desde a mais remota antiguidade, da Babilônia ao Império Romano, da China Imperial ao Egito dos Faraós, das conquistas do Islã na Idade Média aos povos pré-colombianos da América, milhões de seres humanos foram comprados e vendidos como escravos”.(pg 25)
Desde o primeiro leilão de escravos em 1444, no sul de Portugal, este foi o primeiro país europeu com significativa população escrava, de origem africana. Segundo o autor, “por volta de 1550, já contava com cerca de 32 mil escravos, entre mouros e negros, que representavam pouco mais de 3% do total de 1 milhão de habitantes”.(pg 56)
Em decorrência deste mercado promissor o historiador localiza no contexto histórico das grandes navegações a base econômica para as grandes “aventuras” mercantis.
Afirma o autor que: “Desse modo, a partir do leilão de 1444 em Lagos, o comércio de escravos ajudaria a financiar as chamadas viagens dos descobrimentos.
O sangue, o suor e o sacrifício dos cativos permitiriam que os portugueses, no meio do século seguinte, abrissem um novo caminho para as Índias, contornando por mar o continente africano, explorassem as costas da China e do Japão, estabelecessem entrepostos de comércio e especiarias nos atuais territórios da Indonésia e do Sri Lanka e, finalmente, chegassem ao Brasil, que logo se firmaria como a maior e mais lucrativa colônia do Império Português, e também a mais dependente de mão de obra Escrava”. (pg 61)
Em 22 de janeiro de 1510, tem início do tráfico negreiro para a América, que segundo relato “os navegadores espanhóis estavam autorizados a transportar cinquenta escravos para a ilha de Hispaniola”. (pg 106)
Mesmo com o monopólio das “operações bancárias e do financiamento dos negócios em Portugal”, Dom Manoel l em 1496 expulsou do reino todos os judeus e os que ficaram, foram abruptamente declarados como cristãos – novos.
O historiador diz que: “Em 1536, Portugal tinha uma frota de mais de trezentos navios oceânicos, incluindo caravelas e naus”. (pg108)
Como sabemos, a população indígena após a invasão de Colombo e Cabral, foi destroçada pela escravidão, doenças e guerras, pois segundo os mandantes destes crimes “Os nativos que sobreviveram resistiram ao árduo trabalho escravo imposto pelos europeus”. (pg 109)
Para alguns autores, estima-se que na época da invasão de Portugal, existiam de 3 a 5 milhões de nativos no Brasil, em centenas de tribos e falavam mais de 1000 línguas, uma das maiores diversidades linguísticas do planeta.
A dizimação foi tão grande que por volta de 1808, com a chegada da família real ao Brasil, a população três séculos depois continuava 3 milhões de habitantes e uma população indígena em torno de 700 mil, segundo o autor. “Em média, durante o período colonial, o Brasil exterminou 1 milhão de índios a cada cem anos”.(pg118)
Além de doenças e guerras promovidas pelos colonos, a escravidão indígena esteve presente fortemente neste momento histórico. O autor relata a atuação de figuras execráveis que ainda continuam sendo idolatrados como heróis, por muita gente que são igualmente defensores dos colonizados e da matança dos nativos, uma conduta abjeta sem precedente na história humana.
“Capturava-se índios de norte a sul do Brasil. A compra e a venda de cativos indígenas foram a primeira e grande atividade de Campos de Piratininga, região da futura cidade de São Paulo, fundada em 1554 pelos jesuítas do padre e hoje santo José de Anchieta. No século XVI, o vilarejo era, segundo historiador Luiz Felipe de Alencastro, uma “feira de trato”, onde João Ramalho e sua gente forneciam escravos ao Planalto Paulista para a baixada Santista - uma “escala para muitas nações dos índios”, na descrição do padre Luis de Grã”.(pg 123)
São muitos os facínoras transvestidos de corajosos denominados bandeirantes, e toda quadrilha de colonizadores, e, portanto, com ressalvas, o historiador afirma que “embora fossem, de fato, destemidos e corajosos que asseguraram as dimensões continentais que o Brasil tem hoje, os bandeirantes tinham como primeiro e principal objetivo a captura de índios – atividade que exerceram com escala e violência incomparáveis.
As bandeiras eram empreendimentos privados, que em nada dependiam do tesouro real e cujos gastos e lucros eram resultados unicamente da pilhagem, do roubo e da escravidão indígena “.(pgs 126/127)
Para estudioso, Luiz Felipe de Alencastro, calcula em cerca de 100 mil o total de cativos capturados nas entradas dos bandeirantes entre 1627 e 1640, segundo ele, “uma das operações escravagistas mais predatória da história moderna”.(pg128) O livro do Historiador Laurentino Gomes volume I é uma trilogia, onde o primeiro volume compreende o período histórico desde o primeiro leilão em 08 de agosto de 1444 até a morte de Zumbi dos Palmares em 20 de novembro de 1695.
Os outros dois volumes vão tratar do século XVIII, chegando até os dias atuais, com o legado da escravidão que ainda está vivo na nossa memória.
Nestes registros apenas procurei destacar alguns relatos que foram marcantes, sem prejuízo ou desestimulo a leitura do inteiro teor desta magnifica publicação.
O tema central deste primeiro volume foi a ESCRAVIDÃO, de uma maneira geral, mas destaquei a escravidão com os capturados em África e dos nativos brasileiros, muito bem fundamentado e descrito no livro.
Dentre todos os relatos do livro, eu não poderia deixar de transcrever: “O Brasil tem seu corpo na América e sua alma na África, afirmava no final do século XVII o padre jesuíta Antonio Vieira. Essa é uma frase profética que se torna cada vez mais verdadeira. Maior território escravocrata do hemisfério ocidental, o Brasil recebeu cerca de 5 milhões de cativos africanos, 40% do total de 12,5 milhões embarcados para a américa ao longo de três séculos e meio”.(contracapa)
Para o autor “Durante mais de três séculos e meio, o Atlântico foi um grande cemitério de escravos”, pois, em média, cerca de 14 cadáveres eram lançados ao mar todos os dias. “Segundo inúmeras testemunhas da época, mortes tão frequentes e em cifras tão grandes fizeram com que esses grandes peixes mudassem suas rotas migratórias, passando acompanhar os navios negreiros na travessia do oceano, à espera dos corpos que seriam lançados sobre as ondas e lhes serviriam de alimentos”. (pg49)
São inúmeras as citações e fatos históricos horripilantes que o livro descreve ao longo de suas 480 páginas.
O domínio na escravidão não se limitava ao domínio físico e patrimonial do escravagista, haja vista que “Segundo Alberto da Costa e Silva, não faltavam sequer comunidades nas quais o escravo, ao morrer continuava escravo. Ele citou como exemplo: Os Xerbros, no litoral de serra leoa, enterravam o cativo nu ou coberto por trapos, para demostrar que nada possuía e com as mãos e os pés atados por uma corda, cuja ponta comprida devia sair da cova e amarrar-se a um mourão fincado no solo. Antes de sepultá-lo, o dono lhe dava uma chibatada, para deixar claro que continuava a ter autoridade sobre o espirito do morto, que, no além, deveria ser escravo dos antepassados do seu senhor”. (pgs 157/158)
Teria muitas passagens para ser destacadas, mas não tive a pretensão de resumir ou fazer um rigoroso fichamento do livro e muito menos uma síntese. Pretendo continuar levantando outros elementos ideológicos, teológicos e filosóficos citados no presente livro, e “Concluo” com a seguinte narrativa: “O tema da escravidão é um tabu no continente africano por que é evidente que houve um conluio da elite africana com a europeia para que o processo durasse tanto tempo e alcançasse tanta gente, explicou ao site da BBC Brasil, que o entrevistou em 2016. Houve um momento em que os africanos perderam o controle. Como cicatrizar uma ferida tão violenta e profunda?
A resposta brota naturalmente das palavras de Araújo, ao recordar o dramático encontro com o rei ticar: Sempre tive a consciência de que um dos maiores crimes contra a população negra não foi nem a tortura, nem a violência: foi retirar a possibilidade de que conhecêssemos nossas origens. Se qualquer pessoa me perguntar de onde sou, agora já sei responder. Só quem é negro pode entender a dimensão que isso possui. Só conhecendo nossas origens poderemos entender quem somos de verdade. Enquanto não superarmos a escravidão, não teremos paz - nem os escravizados, nem os escravizadores”.(pgs 174/175)
Para entender a origem dessa tragédia que foi e continua sendo a escravidão, é preciso aprofundar inúmeras leituras, releituras e tomar partido ao lado dos pobres e oprimidos, deste longo e histórico sistema dominante, pois no livro, embora o autor não aponte esta leitura factual, demostra que para a classe dominante não tem limite a busca e negociatas e aprisionamentos, tendo como princípio basilar a insaciável dimensão do acúmulo de capital.
Sofredores de todo mundo Uni-vos!
Os dominantes são desumanos, frios, calculistas, cruéis e Assassinos.
Aldo Santos – Militante Sindical, ativista da Práxis- filosófica e da Enfrente!
Prof. Aldo Santos,sim é necessário que conheçamos nossas origens brasileiras. A escravidão deve ser conhecida, esse é um livro importante.
ResponderExcluirSim!! Conhecimento nunca é demais!! Precisamos nos encher-mos ...
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