quinta-feira, 4 de junho de 2020

INTERNACIONAL PROGRESSISTA OU PARTIDO INTERNACIONAL DA CLASSE?


Sem muita repercussão nos meios midiáticos e sem capilaridade nas redes sociais, personalidades de vários países lançam a Internacional Progressista, com a argumentação, dentre outras, de combater o autoritarismo no planeta. 

Segundo reportagem, qualquer pessoa pode fazer parte desta internacional, a exemplo de Bernie Sanders, Noam Chomsky, Yanis Varoufakis, Fernando Haddad e Celso Amorim, e dezenas de intelectuais de várias partes do mundo.

Conforme publicação da revista Fórum, “O objetivo é fomentar a união, coordenação e mobilização de ativistas, associações, sindicatos, movimentos sociais e partidos em defesa da democracia, da solidariedade, da igualdade e da sustentabilidade.”

A referida Plataforma será sustentada por doações e cotizações de seus membros. Este debate vem sendo gestado desde 2018 quando da publicação de um artigo no The Guardian em setembro do mesmo ano.

“A Internacional Progressista pretende atuar em três planos: fomentar a mobilização social, estimular a reflexão intelectual e promover a difusão de novas ideias progressistas através de uma rede de meios de comunicação. Neste último quesito, a ideia é potencializar o impacto das informações criando um elo entre diferentes redações de jornais. Entre os títulos que aderem ao projeto figuram o norte-americano The Nation, o italiano Internazionale, o francês Mediapart, o polonês Krytyka Polityczna, mais Africa Is a Country, Brasil Wire, Lausan Collective e The Wire India. Com informações do El País” 
https://revistaforum.com.br/global/personalidades-lancam-a-internacional-progressista-para-combater-autoritarismo-no-planeta/amp/

Do ponto de vista das lutas comuns de caráter internacional da classe trabalhadora, foram várias as experiências ao longo da nossa história. Evidentemente, que as internacionais vêm de outro desejo e anseio libertários e revolucionários da nossa classe, uma luta de efetiva organização para destruir o inimigo comum que são os meios de produção capitalista.

Diferentemente de uma articulação progressista no âmbito do próprio sistema, o embate que se tem na macro política é a luta entre os que defendem o capitalismo, mesmo com ajustes no seu âmbito, e os que querem destruí-lo, uma vez que não será possível a plena igualdade neste modo de produção.
Foi com as experiências concretas das lutas dos operários diante das criminosas condições de trabalho advindas da revolução industrial que as primeiras formas organizativas se colocaram como desafios para o conjunto da classe. Neste sentido, o pioneirismo de Marx e Engels com a organização da primeira internacional foi um fato marcante na história mundial da classe trabalhadora.

A referência da luta internacional da classe remonta a escrita do Manifesto Comunista, em 1847, que ao final faz o emblemático chamado: “Proletários de todos os países, uni-vos!”, levando assim, a fundação da Primeira Internacional, denominada Associação Internacional dos Trabalhadores, fundada em Londres em 1864, mantendo-se ativa até 1876.

Esta Internacional era uma espécie de federação de agrupamentos ideológicos tais como: anarquistas prudhonianos, republicanos, democratas radicais, etc. Foi um grande passo para desenvolver o conceito de internacionalismo de classe, mas a sua existência findou com um marco da luta dos operários franceses que foi a derrocada da comuna de Paris, em 1871.

A Segunda internacional foi criada em 1889, expressando grande evolução sobre a luta internacional da classe trabalhadora e de caráter socialista.  Importante acúmulo de vitórias estavam presentes neste momento histórico, como o avanço da organização sindical, fortalecimento de partidos políticos e avanços concretos em relação ao direito ao voto e a jornadas de trabalho de 8 horas. 
Os embates internos estavam definidos entre os que defendiam a democracia burguesa, descartando o processo revolucionário para a tomada do poder pelos operários; tese esta, defendida por Eduard Bernstein.
As posições eram nítidas no início do século XX, divididas em três seguimentos distintos, a saber: as elaborações revisionistas de Bernstein, defendendo ideais tipicamente de direita; as teses de esquerda, defendidas por Lênin e Rosa Luxemburgo, e o centro contando com a liderança de Kautsky. 

Com o advento da primeira guerra mundial em 1914, os revisionistas apoiaram o governo conforme expressa a marcante frase de Rosa Luxemburgo, ao afirmar que a socialdemocracia adotara um novo lema: “Proletários de todos os países, uni-vos em tempos de paz e degolai-vos em tempos de guerra”. Os defensores da luta de classe e internacionalistas como Rosa, Karl Liebknecht, Lênin e Trotsky foram reduzidos a inexpressivo grupo. Porém, com a revolução Russa em 1917 a luta internacional dos trabalhadores vai atingir um novo patamar e fundam a Terceira Internacional. Conhecida como Internacional Comunista ou Comintern, fundada por Lenin em 1919, depois do fracasso da Segunda Internacional, e dissolvida por Stalin durante a Segunda Guerra Mundial, em 1943.

A Quarta Internacional, fundada em 1938, por Leon Trotsky, em oposição ao stalinismo, reuniu   milhares de lutadores, mas também sofreu grandes fraturas internas. Trotsky considerou a Comintern irrecuperável, depois de ter sido corrompida sob o controle da elite burocrática stalinista da União Soviética. 

A Quarta Internacional foi desarticulada em 1953, embora várias tentativas de reagrupamento tenham sido realizadas e vários grupos se proclamem, ainda hoje, herdeiros do legado trotskista.

Defensores da Quinta Internacional
Em novembro de 1938, apenas dois meses depois do congresso de fundação da Quarta Internacional, sete membros do Partido Operário de Unificação Marxista espanhol (POUM), processados em Barcelona, declararam seu apoio à "luta por uma Quinta Internacional". O trotskista argentino Liborio Justo, mais conhecido como "Quebracho”, defendeu uma Quinta Internacional, ao romper com o Trotskismo, em 1941.

Outro apelo por uma Quinta Internacional foi feito por Lyndon LaRouche, depois de ter deixado a Liga Spartacus, em 1965. Mais tarde, uma quinta internacional comunista foi fundada em 1994 pela "Liga comunista", uma pequena organização trotskista da Grã-Bretanha, mais conhecida como "Movimento por um futuro socialista", que se desligou do partido marxista em 1990.”
https://pt.wikipedia.org/wiki/Quinta_Internacional

Como podemos observar, são inúmeras as ações no sentido de se fortalecer a concepção internacionalista da nossa classe, ao longo dos últimos séculos.
O século XXI será determinante no avanço desta luta, fundamentalmente pela operacionalização e capilaridade das redes sociais, encurtando as distâncias e transformando essas redes em ferramentas de guerra.

No contexto deste debate, é fundamental todas as formas de experiências no sentido de coesionar a real dimensão e representação da nossa classe explorada pelo capital. Um sentimento maior de unidade e respostas aos mais longínquos cantos do mundo para que haja   o emponderamento dos nossos irmãos que sofrem e morrem pela ganância dos poderosos e das políticas concentradoras de riquezas e terras, em detrimento da morte de milhões de fome, falta de assistência médica, educacional, habitacional, segurança humanitária e permanentes pandemias. Estão dadas as condições para a organização de um partido internacional da nossa classe como porta voz dos espoliados, com um programa capaz de romper barreiras e fronteiras na mais incondicional defesa e superação dos “condenados da terra”. 

Este debate vem sendo ensaiado há vários anos no nosso meio.

“POR UM PARTIDO INTERNACIONAL DA CLASSE TRABALHADORA”

1. O nosso planeta está com mais de 7 bilhões de habitantes, numa escala crescente das  riquezas nas mãos de poucos,  e, em contrapartida,   a disparidade entre ricos e pobres é  visceralmente oposta ao desejo de um mundo justo, digno e solidário entre as pessoas.

2. Com a atual estrutura de fatiamento geográfico do globo em dezenas de países expressa-se a máxima de dividir para governar e com isso se impõe o domínio econômico e de classe, com o predomínio e a existência de impérios ao longo da existência dos homens no planeta.

3. A forma de superar o imperialismo é organizar democraticamente a nossa classe em nível mundial para superar as fragilidades regionais, redirecionar as economias solidariamente, avançar nas relações comunistas que devem orientar as ações dos lutadores e de toda classe em escala mundial.

4. O Capitalismo através de seus mecanismos impositivos constitui países, compõe blocos econômicos e áreas de livre comércio para manter o domínio econômico e consequentemente o domínio de classe.

5. O domínio econômico historicamente já se manifestou na guerra do fogo, nas guerras tribais, nas colonizações, nas matanças de povos nativos, nas guerras religiosas, nas guerras convencionais, na guerra fria, nas guerras virtuais, além das propagandas ideológicas e a busca de hegemonias dilacerantes. Em contrapartida, países periféricos continuam sem o básico e ainda são obrigados a drenar suas riquezas naturais para os países centrais ao preço que eles querem, submetendo as nações dependentes à “eterna escravidão”. 

6. Essa estruturação deve ser alcançada através das lutas concretas e das mediações necessárias até a tomada do poder por nossa classe em escala mundial. É uma combinação da ação horizontal em constante verticalização de forças e estruturação dos trabalhadores, fortalecendo cotidianamente os nossos objetivos e a nossa estratégia revolucionária rumo ao poder da classe trabalhadora que não deve se limitar a fronteiras geográficas existentes.

7. Essa organização terá como alicerce programas e princípios com estratégia de luta sempre a partir dos interesses da classe trabalhadora, que inicialmente poderá se organizar num determinado lugar com adequações táticas, sem perder a concepção estratégica do poder da classe. A base do nosso programa deve ser anti-imperialista, anticapitalista, rumo ao comunismo científico.
8. São inúmeras as referências bibliográficas de que a classe trabalhadora é internacional. O chamado contido no Manifesto Comunista: “trabalhadores do mundo inteiro uni-vos,” soma-se a outros chamados e apelos a essa necessidade organizacional imperiosa.  

9. Reafirmamos esse chamado por entendermos que de fato essa é a mais urgente realidade que se impõe, buscando construir estrategicamente um Partido Internacional da Classe Trabalhadora, dentro dos princípios norteadores da luta de classe, debatido e aprovado pelo conjunto dos trabalhadores unidos mundialmente em torno desse almejado objetivo.

10. No âmbito da elaboração marxista, criaram as internacionais comunistas como forma de irradiar pelo mundo determinados elementos táticos e estratégicos, buscando organizar e influenciar a classe, muitas vezes, sem a devida mediação diante da realidade em determinados países. 

11. É preciso criar um instrumento forte e centralizador de nossa luta que explicite a coesão necessária para se contrapor a ordem capitalista que, além do conjunto das ideias dominantes, dirige e controla mundialmente os seus seguidores e aposta na fragmentação dos trabalhadores dispersos nas mais várias tendências políticas diluídas em centenas de países como forma de manter o poder. 

12. Mesmo diante desse objetivo central, hoje materializado nas internacionais e nas federações existentes no mundo do trabalho em âmbito sindical, popular e estudantil, não encontra correspondência no âmbito partidário que, muitas vezes, são criados para atender interesses imediatos em determinados municípios, estados e em nível federal. Na prática, são balcões de negócios instituídos para atender interesses de grupos econômicos que se traduzem nos interesses e disputas político-partidárias focados e determinados, transformando o público em privado. 

13. A criação dessa ferramenta dialogará em todas as partes a partir de princípios que leve em conta os direitos dos trabalhadores que lutam por uma nova ordem econômica, com objetivos antagônicos aos existentes na sociedade capitalista. 

14. Hoje nos comunicamos através de ferramentas virtuais em dimensão internacional correspondente a dita globalização que nos impõe a necessidade de utilizá-las para dentro e fora da nossa aldeia global. 

15. Essas leituras devem ser efetuadas e as instâncias produzirão novos parâmetros em base a novos paradigmas, necessários ao mundo em permanente transformação.

16. Devemos estabelecer uma estrutura verticalizada com direções rigorosamente centralizadas pela classe, tendo como ponto de partida as bibliografias e experiências concretas descritas nos clássicos reverenciados pelo conjunto da classe trabalhadora.

Finalmente, consideramos que o debate sobre a criação da Internacional Progressista tem a sua contribuição, mesmo que limitada, para seus articuladores, mas, do ponto de vista de classe, em nada se compara aos reais interesses e compromissos revolucionários de ruptura com o capitalismo, rumo à construção de uma sociedade comunista.

Aldo Santos - Ex-vereador em SBCampo, diretor das entidades APROFFESP e APROFFIB, militante da APEOESP e do PSOL

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