segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

A IDEOLOGIA DA ESCOLA “SEM PARTIDO”: O DISCURSO DA DOUTRINAÇÃO E OS MOTIVOS PARA A MILITARIZAÇÃO DAS ESCOLAS




A IDEOLOGIA DA ESCOLA “SEM PARTIDO”: O DISCURSO DA DOUTRINAÇÃO E OS MOTIVOS PARA A MILITARIZAÇÃO DAS ESCOLAS



THIAGO - APROFFIB
Meu nome é Thiago, sou membro da APROFFIB, vou dirigir essa mesa. A APROFFIB é uma entidade que, a exemplo da APROFFESP, reúne professores de Filosofia da educação básica, mas em nível nacional. Desde ano passado, estamos tentando fortalecer nossa organização, contado com o apoio de professores de diversas regiões do país, para que possamos conhecer melhor as necessidades da categoria. Devido aos recentes acontecimentos políticos pelos quais o país passou, nos últimos anos, sobretudo com a MP 746/2016, a famosa “reforma do ensino médio”, a disciplina de Filosofia passou a ser uma incógnita quanto à sua permanência nas escolas públicas e privadas, uma vez que a medida provisória tira a obrigatoriedade da Filosofia e da Sociologia como componentes curriculares.
Portanto, em nome da APROFFIB, convido todos professores e professoras, estudantes e simpatizantes da causa, a se juntarem a nós contra esse retrocesso. Cidadania, democracia e injustiça social são alguns dos elementos fundamentais para a construção de um país melhor, valores que se constroem através da educação. Educação de qualidade precisa de pensamento crítico, análise e reflexão, em suma, Filosofia.
Junte-se a nós, faça sua voz ser ouvida pelo poder público. Conheça a página da APROFFIB no facebook e o site (aproffib.org) e saiba como podemos auxiliá-los. Antes de darmos início ao tema, gostaria de, em nome da APROFFIB, congratular a todas e todos professores que, no início desse semestre, se recusaram a referendar a BNCC. O CONSED, por meio do MEC, sacramentou o 2 de agosto como o Dia “D”, quando supostamente alunos e professores conheceriam a BNCC e proporiam melhorias, mas sabiamente, antenados com a manobra prevista, muitos professores perceberam que o interesse na verdade era de sacramentar a ideia. Foi então que houve um levante por parte da categoria de diversas escolas em São Paulo e de outros estados para recusar ou compactuar com esse documento. E, ao invés disso, assinaram um abaixo assinado pedindo a imediata anulação do mesmo e a revogação da MP 746. Sabemos que não é comum nossa categoria se reunir por uma causa, por isso, por esse gesto, queremos parabenizar os professores e professoras pelo dia 2 de agosto, quando muitos disseram não em sinal de reprovação ao documento antidemocrático.  Não ao desmonte da educação básica; Não à posição arbitrária verticalizada do atual governo! A luta continua.
O tema dessa tarde é “A ideologia da Escola sem Partido, o discurso da doutrinação e os motivos para a militarização”. Essa temática tem ganhado projeção dentro e fora das escolas nos últimos anos, muito tem preocupado os educadores, em especial os professores de Filosofia, porque um debate franco e aberto em sala de aula sobre qualquer tema, política, religião ou ideologia de gênero é inerente a aula de Filosofia.
Sabemos que, há algum tempo, vem ganhando projeção nacional um grupo de pessoas que tenta impor a censura aos temas que devem ser discutidos nas escolas, o chamado Escola Sem Partido. Como acabei de dizer, são imprescindíveis o diálogo, a franqueza e a livre manifestação de alunos, professores nas aulas de Filosofia, assim como em outras. Portanto, qualquer tipo de censura limita a liberdade do docente, além do que essa medida é antidemocrática e inconstitucional.
Também podemos observar que há um número crescente de pessoas se simpatizando com ideias fascistas, defendendo um tipo de governo autoritário e militarizado. De certo modo, isso explica o porquê do movimento Escola Sem Partido tentar impor a censura nas escolas. Para discutir esse assunto, vamos ouvir o autor do livro “Ditadura no gatilho - a Violência Policial”, Jota Burato; a autora do projeto de lei Escola Sem Censura (PL 207/2017) e vereadora de São Paulo, Sâmia Bonfim, e o autor do projeto 578/2016 conhecido como Programa de Escola com Liberdade, deputado estadual, Carlos Giannazi.

JOTA BURATO
É um prazer enorme estar aqui, discutindo um tema tão polêmico, muitas vezes até pensando a sociedade e os próprios movimentos de esquerda, aqueles ligados à educação, que se importam, se incomodam de fato por uma educação libertadora, não uma fábrica de gente.
Se procurarmos no que há hoje escrito sobre a militarização das escolas, vamos achar diversas narrativas de jornais e revistas importantes, tanto de direita como de esquerda. Analisando como se iniciou esse processo de militarização vamos encontrar no estado de Goiás, em 2014, uma experiência pioneira. O que aconteceu? Algo que todos nós aqui já sabemos, que muitas vezes acontece na periferia, de todos danos que nós temos lá. Então, tráfico de drogas no banheiro, a morte de um ex aluno dentro da sala de aula, um homicídio, sequestro relâmpago de uma professora na frente da escola. Isso contando com outros aspectos lá também, tidos como aspectos violentos. Então, o governo entendeu que deveria iniciar esse processo, na tentativa de conseguir, segundo seu ponto de vista, ministrar aulas, fazer que aquelas crianças e adolescentes aprendessem, assim como eliminar a violência e impor respeito aos professores e ao próximo também. A solução foi militarizar a educação. Como? A ideia foi colocar militares na administração da escola, e para ficarem os professores tiveram que concordar com o método.
E o que está sendo passado nessas escolas? Conceitos e forma de ver a vida e a realidade autenticamente militares. Além do que foi apresentado a Ordem Unida, um movimento típico militar. Nos perguntamos, qual o problema de crianças ou adolescentes praticarem a Ordem Unida, além de todos os movimentos militarizados nas escolas? A continência para os professores, por exemplo, quando entram em sala de aula. O professor e professora não são prô, é senhor e senhora, eles são do conselho militar, de hierarquia, introduzindo assim a disciplina, que é outro detalhe.
Então, nos perguntamos, por que existe um movimento da Ordem Unida no meio militar? Vamos pensar, por que eles marcham em três colunas, cada uma delas com 20 ou 25 pessoas, todos perfilados em movimentos idênticos e obedecendo a voz de comando, alguém está no comando daquele movimento, qual o sentido disso? Muitos vão dizer que é trabalhar em equipe, mas existem outras maneiras de você aprender a trabalhar em equipe enquanto um ajuda o outro. Ali, na verdade, cada um tem que fazer o seu movimento de forma perfeita, é a maneira de como ele ajuda o próximo ou o seu companheiro é não errando.
Então, qual é o pensamento central da Ordem Unida? Se não a própria resposta para a ordem dada, o pronto cumprimento para qualquer tipo de ordem, mesmo de maneira irrefletida. Porque vem a ordem de virar esquerda e virar direita, seja para que lado for, e todos têm que, imediatamente, cumprir dentro daquele espaço. Essa disciplina militar é antiga, vem desde Frederico II, que levava os homens a treinamentos exaustivos para poder suportar a guerra e todos os movimentos e obedecerem de forma irrefletida, imediatamente. Muito bem, esse são um dos componentes que estão nessa história.
A militarização das escolas cresceu muito nos últimos 5 anos, estima-se um acréscimo de 12% no país. A única região que ainda não tem, porque ano que vem o Espírito Santo terá uma, é a Sudeste. Então, nós pulamos para 112 escolas aproximadamente nos dias de hoje. O que eu quero, de fato, passar além de tudo isso é, primeiro, o apoio popular que está tendo para a construção dessas escolas, os pais dos alunos estão adorando. Em 2016, no ENEM, as sete primeiras escolas de Goiás eram militares, então, o desempenho dos alunos melhorou bastante, assim como o comportamento, inclusive em casa.
A grande verdade é que a escola militarizada foi levada para a periferia e nós entendemos que, por uma razão única, que é, de fato, docilizar a juventude periférica, controlar e fabricar comportamentos desejáveis em pessoas. Por que isso? Por que não vão investir na prevenção primária?  Eles fizeram isso alegando a violência das regiões periféricas, mas não vão investir na prevenção primária, que trata a origem, não vão mexer com o sistema social, não fizeram e não vão fazer. Então, como eles podem resolver? É controlando aqueles que são as grandes vítimas dessas diferenças sociais.
Então, isso é virar as costas para a educação e formar robôs, é robotizar pessoas, é formar coisas. Estudando sobre a violência policial, em específico a Polícia Militar, entendemos que a ideologia militar está entre os elementos determinantes desse processo.  A partir do pensador Louis Althusser, que escreveu Ideologia e Aparelhos Ideológicos de Estado, eu consegui ver alguns elementos que explicam aquilo que nós vemos dentro da Polícia Militar. Dentre todos esses movimentos, tornamos a falar da ordem militar e da ordem dos movimentos corporais, que disciplinam o corpo e compõem um processo de ideologia. Existe uma ideologia geral que é para todos nós, que Althusser chama de ideologia dominante. A ideologia que nos faz dizer, quando já adultos, que tudo está certo e não poderia ter sido diferente.  Foi assim com meus pais, com meus avós, e por aí vai. Dizer amém para tudo é a função da ideologia dominante e nós aprendemos isso na família.
Althusser considerava no tempo dele, na década de 70, século passado, que a escola era o aparelho ideológico mais excelente, porque tinha as crianças submetidas em longo tempo, àquela docilização dos corpos e à absorção da ideologia dominante que as levava a ter comportamentos desejáveis. O mesmo ocorria na igreja e tantos outros espaços. Dentro das corporações militares, além dessa ideologia geral, que é comum a todos nós, quando o homem ou mulher entram nessa corporação, sofrem uma nova dose, uma nova carga de ideologia militar. Então, é uma transformação do ser social em ser militar. A partir das estruturas que o militarismo tem, a hierarquia e a disciplina são fundamentais, esse controle ideológico e esse sentimento de dever que é muito fortemente trabalhado e funciona como uma argamassa que liga esses homens à ordem e aos princípios da própria hierarquia e disciplina. Caso contrário, eles só fariam e cumpririam tais movimentos mediante à coerção.
Neste sentido, Althusser falava da religião que usava maneiras de se afirmar, era a manifestação da ideologia na prática. Da mesma forma, podemos dizer do meio militar e das polícias militares. O movimento como aspecto, como elemento de fixação ideológica, de uma maneira de ver o mundo totalmente diferente, porque a maneira de ver o mundo militar é diferente, ele é melhor, é mais responsável, não é corrupto, é tudo isso que se planta nesse tipo de ótica. O tempo é muito curto para dizer todo o processo ideológico que é feito dentro de uma instituição militar, que modifica um homem que veio do povo, um homem que tinha alta sensibilidade e passa a ter uma nova visão de mundo, porque se criou ali um homem ou mulher de guerra, isso dentro da Polícia militar, Exército, Marinha, Aeronáutica. Ou seja, alguém que era um ser comum torna-se um ser de guerra. O que é um ser de guerra, um soldado? Um soldado foi treinado para combate, para conflitos, para dominação de territórios e para defesa de territórios, um homem ou mulher de guerra.
Razão pela qual, quando falamos dos Direitos Humanos é muito difícil introduzir esse tema no meio dos militares, porque o que é a guerra, afinal de contas? A guerra é a maior negação que temos da humanidade. Como falar de Direitos Humanos para pessoas que estão inseridos no pensamento de guerra? Hoje, quando nós temos a discussão acerca da desmilitarização da própria polícia, o que seria adequado e conveniente para a nossa sociedade, para o avanço da segurança pública? Além da resistência de forças políticas fortes, temos esse processo da militarização das escolas, que, como falamos, foi uma resposta ou uma forma de dar para a sociedade algo que ela espera.
Dentro da periferia onde não será trabalhado e nem se investirá para que a origem de todos os problemas, sobretudo de violência, seja sanada, a resposta é tentar mudar corpos. O que vai de acordo com a prevenção secundária, terciária, que aposta em polícia, em leis, e por isso se fala tanto em reduzir a maioridade penal, se aposta tanto em presídios. Então, nessa lógica, para que não haja a necessidade da polícia agir e para que os presídios não fiquem lotados de pessoas da periferia, um dos pensamentos é: “vamos militarizá-los, porque nós não daremos a eles a educação que necessitam, nós não discutiremos sobre educação que pode libertá-los, nós matamos neles o pensamento crítico e os tornamos em pessoas dóceis, que responderão até politicamente lá na frente favoravelmente a um processo que os cria para esse fim, que leva essa ideologia para esse fim”.
Quero agradecer a todos, porque isso é só uma explanação de um assunto muito mais profundo, há muito mais a se falar sobre a própria escola militarizada e o que lá ocorre. Como as regras de comportamento que lá existem, divididas em penas leves, médias e graves. Uma leve, por exemplo, é você utilizar óculos com a armação com cores consideradas esdrúxulas. As médias têm a ver com o uniforme, cabelo cortado, para cada uma delas existe um tipo de punição, advertência. Agora, existem as graves, que dizem respeito às convenções sociais e podem ocasionar a expulsão do aluno, o que era muito comum na época da ditadura militar, e caíam sobre quem não queria estudar, segundo a visão deles.  Isso sem contar que nas escolas militarizadas há taxas de matrícula, uniformes são cobrados, as mensalidades, embora pequenas, são cobradas, e muitos não podendo pagar, sequer as procuram. Então, existe até uma elitização dessas escolas, que estão sendo utilizadas para fim políticos também.
O que podemos dizer sobre a Escola sem Partido, e aqui vou reprisar a opinião de um importante professor da USP, é que esse pessoal deveria ir para cima das escolas militares, porque em termos de doutrinação, elas são o único lugar que faz sentido, lá de fato os alunos são doutrinados. A doutrinação já vem pela própria maneira como as coisas são feitas. O que eles querem impedir, na verdade, é o contraponto ou a resistência de pensamentos que possam libertar, que possam levar alunos a ter criticidade e reflexão. Enfim, pensamentos que possam libertar essa camada importante da nossa sociedade, para que dê fruto lá na frente, pois o único fruto que eles querem é o amém.

CARLOS GIANNAZI
Boa tarde a todos e a todas, é um prazer enorme estar aqui com vocês novamente na Assembleia Legislativa, sobretudo aqui no plenário Franco Montoro. Quero saudar todas as pessoas presentes, as delegações que vieram do interior paulista, da Baixada Santista, da Grande São Paulo e daqui da capital. Saudar a coordenação da APROFFESP, nossos colegas da mesa, o Thiago que está coordenando os trabalhos, o Jota que acabou de fazer uma explanação importante sobre esse tema da escola militarizada, nossa vereadora Sâmia aqui da capital e o João Batista que está secretariando os nossos trabalhos.
Vocês receberam o nosso projeto de lei 194/2015, que institui no ensino fundamental da rede estadual de ensino a disciplina de Filosofia, resultado de uma construção coletiva, junto com o Aldo, o Gretter, a Associação, vocês, e que nós protocolamos. O projeto continua tramitando aqui e enfrentando obstáculos, porque, principalmente nesse momento histórico em que eles querem retirar a Filosofia do ensino médio, nós queremos incluir. Mas, é importante que nesse momento de retirada de direitos, nós possamos afirmar direitos, nós não podemos ficar só na defensiva, temos que partir para o ataque também. Nós continuamos aqui na tentativa de aprovar esse projeto. Existem redes municipais que já implantaram a Filosofia no ensino fundamental e muitas escolas particulares. Então, não é nada de outro mundo e não é impossível.
Sobre Escola Sem Partido é bom que todos saibam que esse projeto é inconstitucional, com parecer e decisão do Supremo Tribunal Federal. Já tem parecer da Procuradoria Geral da República, inclusive, que eu utilizei aqui para derrotar o projeto na Assembleia Legislativa. E tem até um parecer da ONU, dizendo que é inconstitucional, o projeto é uma aberração. Então, do ponto de vista legal, ele não tem viabilidade, mesmo que seja aprovado numa Câmara Municipal, numa Assembleia Legislativa, mesmo no Congresso Nacional.
Aqui na Assembleia Legislativa nós derrotamos esse projeto em 2016, ele passou pelas comissões e quando chegou na nossa comissão de Educação, da qual sou membro titular, eu fui relator do projeto, dei o parecer contrário, utilizando os pareceres, inclusive da PGE - Procuradoria Geral da República, nós enterramos o projeto aqui. Era do deputado Luiz Fernando do PSDB, que hoje é prefeito de Jundiaí e está tentando implantar lá, mas não tem amparo legal.
Esse projeto afronta vários princípios da LDB, assim como da Constituição Federal e do Plano Nacional de Educação, que nós aprovamos em 2014. Então, ele é inviável do ponto de vista legal, o que existe ainda é um movimento que tenta, na verdade, fazer uma pressão psicológica em cima das escolas e dos professores. Eu não gosto nem de utilizar mais esse nome Escola Sem Partido, eu falo que é a introdução da amordaça e da censura, é isso que eles querem fazer.
O nome é atrativo, porque nós também entendemos que a escola não tem que ter partido político. Ela tem que ter partido de classe social, ela toma o partido dos trabalhadores, das classes subalternas do poder, das classes oprimidas, aí nós temos que tomar partido, partido de classe social, não de partido político. A escola não pode doutrinar do ponto de vista partidário ou mesmo religioso, como vem acontecendo, isso nós somos contra. O que nós de esquerda queremos? Queremos desenvolver o senso crítico dos nossos alunos, queremos que nossos alunos sejam formados para o pleno exercício da cidadania, e oferecemos os elementos para isso.
Agora, não queremos doutrinar os nossos alunos, o próprio Paulo Freire era contra a doutrinação para a esquerda ou direita, nós queremos uma outra coisa dos nossos alunos. Então, é importante a gente nem usar esse nome Escola Sem Partido e dizer a eles que nós somos contra a censura e a mordaça nas escolas. Eles ainda tentam, de alguma forma, fazer uma pressão, tentando intimidar professores, tentando fiscalizar.
Aqui em São Paulo tivemos algumas experiências, há duas ou três semanas atrás, em uma Escola de Educação Infantil, a EMEI Monteiro Lobato, a professora Ângela, nossa colega da rede municipal de ensino, foi perseguida por esses grupos porque estava trabalhando a questão da sexualidade para combater o preconceito contra a homossexualidade. Enfim, vocês acompanharam isso, saiu inclusive na imprensa. Ela tem um aluno, um menino de quatro anos que pinta as unhas e, de vez em quando, vai de saia, e as crianças começaram a questionar. Ela aproveitou esse gancho para fazer um trabalho de combate à homofobia e ao preconceito em relação a esse aspecto da sexualidade, que todos nós temos que fazer. A professora falou que não tem nada demais uma criança, um menino pintar as unhas. Um pai oportunista fez um vídeo com uma criança, com seu filho e colocou na internet e a professora acabou sendo perseguida, hostilizada.
Nós tivemos também um caso que a Sâmia acompanhou bastante, que é o do Holiday, vereador da Câmara Municipal, do MBL, que andou entrando em algumas escolas da rede municipal para tentar fiscalizar o trabalho dos professores, dizendo que os nossos colegas estavam doutrinando os alunos. Foi em três escolas, duas da zona sul e uma da zona leste, tentando intimidar os professores e as escolas. Imediatamente, acionamos pela Assembleia Legislativa o Ministério Público Estadual, acusei o vereador de abuso de autoridade, já que nenhum parlamentar pode entrar em sala de aula para fiscalizar o trabalho de professor. O Ministério Público abriu o inquérito civil, ele recuou e não foi mais nas escolas. 
Então, é bom que vocês saibam disso, nenhum parlamentar pode entrar na sala de aula sem autorização do professor. Às vezes, eu vou na escola, visito muitas escolas públicas, as municipais e as estaduais, para denunciar o abandono em que se encontram, para cobrar que o estado faça reforma, para denunciar as superlotações das salas, a violência, essa é a função de um parlamentar, mas não de fiscalizar o trabalho.
Eu recebo muitas denúncias de escolas do interior, de algumas regiões, onde os professores são, às vezes, constrangidos, perseguidos, assediados por esses grupos, por alguns pais ligados a esses grupos MBL, Bolsonaro, esses setores mais conservadores. Então, nós fazemos interferência e acionamos o Ministério Público, ou as Secretarias de Educação, enfim, a gente toma medidas aqui pela Assembleia Legislativa para inibir. Inclusive, se vocês forem vítimas e assediados por esses grupos, podem nos procurar que a gente sabe como fazer, nós já enquadramos vários dirigentes de ensino que estavam dando apoio para esses grupos no estado de São Paulo.
Eu entrei na rede estadual de ensino em 1984, para lecionar História. Era fim da ditadura militar, mas ainda era o regime, nós tínhamos no currículo escolar Educação Moral e Cívica e OSPB, duas disciplinas que, na verdade, substituíram a Filosofia e a Sociologia, retiradas do currículo escolar do ensino médio nos anos 1960/70, na reforma dos militares. E nós de História também tínhamos formação para lecionar, por incrível que pareça, Educação Moral e Cívica e OSPB.
Os conteúdos que recebíamos nos materiais didáticos eram quase que escola sem partido, não havia muita diferença. Eles estão reeditando isso. Inclusive, na época existia outro cargo para o qual cheguei a ser nomeado denominado Orientador de Educação Moral e Cívica. O professor de História ganhava 20 horas aula para organizar eventos cívicos dentro da escola, junto com o centro cívico, na época não existia grêmio estudantil, e que era uma tentativa dos militares de controlar o movimento estudantil, de adestrar os nossos alunos. Para você ter acesso a esse cargo tinha que ter uma autorização do DOPS (Departamento de Ordem Política e Social), era um absurdo. E, logicamente, eu subverti o cargo e todas as aulas de Educação Moral e Cívica e OPSB, embora os conteúdos, existiam conteúdos fossem todos nessa linha de mordaça, de censura. Então, esse filme é velho.
O Escola Sem Partido e o debate da ideologia de gênero, que aparece junto, é uma das coisas mais absurdas que existe. O termo ideologia de gênero, que eles criaram, na verdade, está dentro de um contexto maior de ataque à educação e aos trabalhadores. Estamos vivendo um momento de retrocessos, de retirada de direitos trabalhistas, sociais, previdenciário, de canalização de recursos públicos para setores privados. Não é à toa que eles querem fazer, a todo custo, também agora a reforma da previdência social.
Além de tudo isso, a lei da terceirização, confirmada agora pelo Supremo Tribunal Federal, ataca ferozmente o concurso público de provas e títulos, e se não for revogada a gente não vai ter mais concurso público para professor. Inclusive, a rede Globo, na novela “O tempo não para”, usou quase 20 minutos numa cena atacando os professores e o concurso público numa escola da rede municipal aqui em São Paulo, ambientada na Freguesia do Ó. O capítulo entrou no ar logo após a decisão do Supremo Tribunal Federal, que referendou essa terceirização selvagem.
 Se não houver uma revogação dessa legislação, talvez haverá concursos públicos somente para cargos da magistratura, auditores fiscais, cargos que chamamos de carreira do Estado, as outras serão terceirizadas, inclusive a nossa de professores. Aquele artigo que conquistamos com muita dificuldade, na Constituição de 1988 - que o ingresso no magistério público seja feito exclusivamente através do concurso público de provas e títulos - praticamente fica neutralizado com a decisão do Supremo e com a lei da terceirização. A Escola Sem Partido tem a ver com tudo isso, agora essa tentativa do governo de colocar goela abaixo a Base Nacional Comum Curricular. O que eles querem é precarizar toda a mão de obra brasileira, é isso que vai acontecer, eles querem formar um tipo de trabalhador que não tenha mais nenhum tipo de direito trabalhista, previdenciário, de direito social, um trabalhador terceirizado, e aí a educação tem que preparar esse novo trabalhador.
Por isso a educação é atacada de todas as formas, através da falta de financiamento, quando eles aprovam a emenda 95, que congela os investimentos, inviabilizam, por exemplo, o FUNDEB. O piso nacional salarial que conquistamos está inviabilizado e, sobretudo, o plano nacional de educação, principalmente na última meta, a de número 20, onde conquistamos os 10% do PIB para educação, já era pessoal, acabou inviabilizado com essa emenda. Inclusive os planos estaduais e municipais que já foram aprovados aqui, e que são muito ruins, ficam inviabilizados.
Esse é o cenário, ataques à educação de todos os lados, porque eles querem formar um aluno submisso, que aceite passivamente essa nova conjuntura, sobretudo esse novo mercado de trabalho precarizado:  trabalhador sem direito, ganhando muito menos, com muita rotatividade de mão de obra, sem possibilidade de aposentadoria. Por isso é que eles querem tirar a Filosofia, a Sociologia, rebaixar o currículo escolar no ponto de vista da formação para a cidadania.
Então, toda essa reforma tem a ver com a questão da superestrutura, não é à toa, ela não foi pensada separadamente, sempre foi assim na história do Brasil, na história do mundo. O sistema educacional sempre esteve a reboque para legitimar o sistema econômico e o político, e é isso que eles estão tentando fazer agora. Assim como fizeram na época da ditadura empresarial militar, adaptando a educação brasileira para que reconhecesse e incorporasse o estado autoritário brasileiro, a ideologia de segurança nacional. Tudo foi preparado para transmitir todo aquele aparato ideológico dos militares e nós fomos vítimas disso, nossa educação, nós que nos formamos naquela época na educação básica e até nas faculdades. Quem aqui não teve educação moral e cívica? Poucas pessoas não tiveram, porque a disciplina, mesmo com o fim do regime militar, permaneceu no currículo até 93, retirada somente no governo do Itamar Franco. Outra que pegamos também foi a EPB – Estudo de Problemas Brasileiros, uma disciplina obrigatória em todos os cursos superiores, normalmente lecionada por um general do exército, por um padre conservador, por um pastor de direita, eles escolhiam esses professores na faculdade, em geral era assim que funcionava.
Por isso eu digo que nós já conhecemos esse filme, projeto que estão tentando implantar de novo. Do ponto de vista legal não há amparo, mas eles tentam fazer a disputa desse discurso, tentando jogar a população contra nós. A gente tem que tomar cuidado, porque aí é que mora o perigo, não é na lei, mas o que nos preocupa é a disputa da narrativa de jogar a população contra nós.  Quando a gente vê a rede Globo gastando 20 minutos numa novela de um horário nobre para atacar o professor, para atacar o concurso público, isso não é à toa, isso não é um acidente, isso é deliberado, já é uma preparação. A grande mídia empresarial vai fazer essa disputa, o que, na verdade, acontece o tempo. Então, temos que nos preparar para fazer esse debate.
O que nos consola nesse momento é que há resistência a tudo isso, nós estamos aqui na Assembleia Legislativa, o projeto já está derrotado, ele não vai prosperar. Porque sempre é um projeto de um parlamentar, não é um projeto do governo, nem o Temer mandou um projeto como esse. São esses deputados, vereadores, senadores conservadores fundamentalistas que encaminham tais projetos. O importante agora é fazer o debate, um trabalho de conscientização com os pais, com os alunos sobre esse processo. Porque o que nós defendemos é uma participação crítica, uma educação emancipadora, libertadora, essa é a educação que nós defendemos. A educação tem um papel fundamental, principalmente nesse momento de trevas, quando eles atacam o setor, o Brasil, atacam a cultura.
Os grupos fundamentalistas saíram do armário e estão desfilando e tentando ocupar espaços, mas nós vamos ocupar espaços também, não vai ser fácil para eles. Só lembro que nesse ano de 2018 estamos comemorando os 50 anos do livro Pedagogia do Oprimido, do Paulo Freire, grande clássico mundial da área da educação. Inclusive, estamos fazendo debates, seminários sobre os 50 anos de Paulo Freire, que é um farol, uma luz para todos nós, principalmente nesse momento que eles tentam atacar a educação crítica, a educação libertadora, a educação cidadã.

SÂMIA BONFIM
Boa tarde a todos e a todas. Queria agradecer o convite para participar dessa mesa junto com vocês, debates como esse são sempre fundamentais, poder reunir a categoria, os professores. Mas, na conjuntura em que estamos vivendo, a nossa organização e tudo que aponte para o aprofundamento da discussão, de organização e armação dos trabalhadores, sem dúvida, é extremamente importante. Queria também cumprimentar o companheiro Carlos Giannazi, que é um parceiro em várias lutas em defesa da educação aqui no município e também todos os demais que estão aqui no dia de hoje.
O Carlos Giannazi comentou a respeito de um episódio que teve aqui na cidade de São Paulo, envolvendo o vereador Fernando Holiday, que visitou algumas escolas na tentativa de fazer a fiscalização dos professores em sala da aula. No sentido de saber se estavam com conteúdo doutrinador, amparado na força social que o projeto Escola Sem Partido tem. Como já foi dito, esse não é um projeto que tem viabilidade constitucional, e é facilmente derrubado em diferentes instâncias jurídicas, já aconteceu isso em alguns estados do país.
Entretanto, o mais preocupante do projeto Escola Sem Partido, na verdade, é a força organizativa de um setor mais conservador da sociedade, que, de fato, identifica no professor o principal responsável pelos problemas gerais da falta de qualidade que as crianças e jovens no Brasil estão submetidos na área da educação. É muito mais fácil, diante desse momento de ajuste econômico e de retrocesso que a gente vive no Brasil, criminalizar e culpabilizar o profissional da educação do que identificar no plano de governo, no plano econômico e na responsabilidade do estado a situação que, muitas vezes, as nossas crianças são submetidas nas escolas.
Então, essa disputa de narrativa que foi colocada sempre arrebenta para o lado mais fraco, que, muitas vezes, é o lado dos professores. Não à toa há tantos pais que vão para cima dos professores, culpabilizando-os por tratarem desse ou aquele assunto em sala de aula.   Semana passada, uma professora passou por essa situação, depois ter conseguido, muito sabiamente, explicar aos seus alunos o respeito à diversidade sexual, de orientação e identidade de gênero, mesmo sem nenhum tipo de instrução ou de estímulo por parte do estado. O pai culpabilizou a professora, o que teve eco na sociedade, inclusive dentro do parlamento e na Câmara de vereadores. Dois ou três vereadores foram à tribuna para pedir punição da professora, alegando que ela não poderia aplicar a doutrina de gênero dentro da sala de aula. No entanto, teve o nosso combate para respeitar uma professora que, sabe-se lá por qual motivo, tinha o preparo para lidar com uma situação adversa como essa.
E isso não é um caso isolado, infelizmente a gente recebe, semanalmente, relatos de professores que são criminalizados pelos pais e, muitas vezes, pelos próprios alunos, principalmente aqueles que são um pouquinho mais velhos e mantêm esse sentimento conservador. Também não é à toa que a gente vê grupos como o MBL, do vereador Fernando Holiday, se multiplicando entre a juventude, que se organizam e disputam grêmios de algumas escolas. Em várias cidades do interior eu tive relatos do potencial de crescimento de organização também para uma articulação que eles fazem nas redes sociais. Então, o mais pernicioso do Escola Sem Partido, mais do que o projeto em si ou a sua possibilidade de ser aprovado nas Câmaras do país, é o seu potencial de organização social e de articulação desse sentimento mais conservador e de vingança contra os professores, responsabilizados pela qualidade do ensino, no lugar do estado.
O que, na verdade, está em disputa com esse projeto é o plano que está avançando nas Câmaras, nos Parlamentos e em todo o país, que é o projeto de mercantilização da educação. Não é à toa que a emenda constitucional 95 foi aprovada, eles querem disputar o orçamento público, querem destruir essa realidade social. Com a aprovação da emenda, eles já deram o primeiro passo. Segundo estimativas, a partir da emenda, a área da educação teve uma perda econômica de cerca de 24 bilhões de reais.  Então, isso significa que não há uma possibilidade de avanço do ponto de vista do desenvolvimento no setor, mas de retrocessos profundos. Se a gente já não tinha as condições adequadas que gostaria, com a emenda constitucional 95 a coisa fica ainda pior.
Mas, a educação precisa existir, o ensino básico, para que o país tenha qualquer tipo de formação, desenvolvimento no mercado de trabalho. E é aí que mora o problema, se trata de um projeto de mercantilização também do ensino básico, algo que já está muito avançado principalmente na educação infantil, aqui na cidade de São Paulo. A boa parte das CEIs, EMEIs, as chamadas creches, são feitas através de parcerias com ONGs e OS – Organizações Sociais, que administram esses espaços. Os professores, muitas vezes, não têm a formação adequada, não são pedagogos, enfim, são trabalhadores que precisam tirar o seu sustento e acabam tendo que cuidar de 30 ou 40 crianças pequenas, não raras vezes, em condições insalubres.
No ano passado a gente teve um caso tristíssimo de uma criança que acabou morrendo numa dessas creches conveniadas, porque a cuidadora a esqueceu debaixo do sol, foi um caso trágico, isso não acontece todas as semanas. Mas, é sintomático do que significam essas Organizações Sociais, que são, na verdade, verdadeiros caça níqueis do dinheiro público, é uma verba que é repassada para que elas administrem, sem nenhum tipo de controle social, sem profissionais com formação, com baixa remuneração.  Essa mesma fórmula, que funciona principalmente para favorecer grandes conglomerados econômicos, em sua maioria com representação nos espaços legislativos, é a real escola com partido. Porque são os partidos políticos que têm os seus representantes locais, que, muitas vezes, são os responsáveis por essas OSs que administram as creches. É um modelo que funciona para ganhar muito dinheiro e precarizar a educação e o trabalho do profissional do setor, que se pretende replicar para outros níveis educacionais.
Essa proposta da BNCC é um avanço concreto e real de parte do que significa a Escola Sem Partido. É uma proposta muito perigosa que, junto com a reforma do ensino médio, significa reduzir a obrigatoriedade do Ensino básico para Português e Matemática. Assim como excluir as demais disciplinas ou serem ministradas através de ensino à distância por empresas que fariam uma subcontratação de profissionais, obviamente com salários e condições de trabalho muito piores, rotatividade. Com uma consequente piora na qualidade da educação dos jovens, porque nada substitui o ensino presencial, nada substitui a complexidade e a diversidade de todas as disciplinas e nada substitui a escola como a gente conhece, sua diversidade, sua possibilidade de formação, de reflexão, enfim, a troca entre comunidade, pais, alunos, etc.
A BNCC não pode passar e a reforma do ensino médio precisa ser revogada, porque ela faz parte desse pacote de mercantilização da educação. Há muita gente que lucraria com isso. A Kroton e a Bahema, por exemplo, dois grandes conglomerados educacionais são os principais articuladores dentro das Casas de poder e os principais interessados neste projeto. Isso é muito semelhante ao que é a cortina de fumaça da Escola Sem Partido, porque não significa só uma disputa ideológica, censura ou uma amordaça nos professores e nos estudantes. Significa preparar uma nova geração para um mercado de trabalho futuro que não precisa de formação de qualidade e crítica, não precisa de uma atuação reflexiva, não espera que os jovens sejam sujeitos sociais, sujeitos políticos, ou que os professores tenham esse papel, muito perigoso para a ordem, que é o de contestação, de formação de estudantes, de organização para a luta. Eles estão preparando o mercado de trabalho e uma sociedade de alienados, de jovens que vão ser inseridos em trabalhos intermitentes, tendo em vista o que foi a aprovação da reforma trabalhista, contrária aos preceitos da CLT.
Somam-se a esse cenário, o ataque à seguridade social, privatização do SUS, que também está repetindo essa fórmula de administração por OSs, através do repasse, subcontratação. Uma proposta da previdência que eles querem, a todo custo aprovar, tentaram aprovar aqui no município de São Paulo para os servidores, mas não conseguiram porque teve força, luta e organização. A greve dos servidores públicos esse ano foi um divisor de águas no que significa o potencial de crescimento do ex-prefeito João Dória, que quer se colocar como Governador do Estado, porque foi uma derrota muito importante, duas ou três semanas dele abandonar o cargo para poder se lançar como candidato ao governo.
Isso só foi possível em função da organização dos professores, que são a maior categoria dos servidores municipais. Infiltrados nos bairros e nas comunidades, conseguiram dialogar com a população que apoiou a greve, porque a identificou não só como econômica ou uma greve corporativista, como o Dória queria categorizar, mas também como uma luta política contra um prefeito, contra um projeto de destruição dos direitos sociais e de destruição da cidade que estava e continua em curso com o seu substituto o prefeito Bruno Covas. Essa greve foi muito importante, porque mostra um pouco qual é o caminho para que a gente possa barrar esses processos de destruição dos nossos direitos, de destruição da seguridade social e também para que a gente consiga ter força para reverter todas essas decisões que foram tomadas principalmente a partir da ascensão do governo Temer.
É evidente que nada disso começou com o Temer, inclusive o próprio projeto Escola Sem Partido começou a ganhar força quando a discussão de gênero nos planos nacional, estadual e municipal de educação, foi barrado e, coincidentemente, figuras como Jair Bolsonaro se fortaleceram no cenário nacional. Foi exatamente em torno dessa discussão da possibilidade de se debater gênero, discutir diversidade para que os professores tivessem essa formação e condição de lidar com isso dento da sala de aula. Na época, o governo do PT optou por abrir mão de fazer essa disputa para criar uma maioria dentro das casas legislativas e essa maioria foi junto com setores conservadores e fundamentalistas. Foi aí que eles conseguiram se fortalecer, não à toa que a gente também assiste boa parte dessa cena deplorável se desenvolvendo Brasil afora, com setores raivosos fortalecidos, saindo do armário, inclusive tendo um bom desempenho nesse processo eleitoral.
O projeto Escola Sem Partido foi se formalizando a partir dessa primeira disputa que eles conseguiram ganhar nos planos municipais, estaduais e nacional. Agora, o projeto de sociedade que a gente precisa disputar é tanto do ponto de vista ideológico - diante de uma sociedade conservadora, em que existe uma tutela do trabalho docente e do potencial de rebeldia e de desenvolvimento da juventude - como também do ponto de vista econômico, uma disputa em torno do orçamento que já está cada vez mais apertado nas áreas sociais. Então, nós temos muita luta para fazer no próximo período e isso diz respeito também ao processo eleitoral no qual estamos passando, diz respeito aos nomes que estão se fortalecendo, que se apresentam como alternativa na televisão. 
A gente vê, por exemplo, o Henrique Meireles que fez uma proposta muito interessante e ousada. Ele falou que tem a possibilidade de ampliação do FIES como uma forma dos jovens que saem do ensino médio poderem seguir na formação superior. Ao mesmo tempo que propõe algo como se fosse PROUNI da educação básica, que, em outras palavras, seria aumentar vagas nas escolas privadas com subsídio do dinheiro público, que foi exatamente o que aconteceu com o PROUNI do ensino superior. E isso não é um raio em céu azul, eles não tiraram isso do nada, isso estava formulado na carta que o Banco Mundial fez para os principais países, principalmente para os subdesenvolvidos. Inclusive, eles apontavam para o Brasil a possibilidade de cobrança de mensalidades em universidades, que é algo defendido pelo Geraldo Alckmin em rede nacional. Quando ele coloca, por exemplo, o direito à creche como uma oposição à possibilidade de os jovens estudarem em universidade públicas, como se fosse um bando de mimados, uma elite econômica, aqueles que só querem saber dos seus interesses, enquanto a maioria da população precisa de creche. Só que eles não dizem que o orçamento que deveria e poderia servir para arcar com todos esses direitos sociais é consumido por eles mesmos, pelos seus amigos banqueiros, pelo pagamento de uma dívida pública.  Na verdade, eles desviam também boa parte desse orçamento para garantir o lucro dessas organizações sociais.
Então, esse projeto está sendo discutido e está avançando em nosso país, com esses principais representantes no processo eleitoral, mas também com aqueles que eles conseguem cooptar no seio da classe trabalhadora e que viram a sua munição e armas contra os professores. Por isso que, mais que a nossa discussão, ou mesmo mais que a nossa atuação parlamentar, a gente tem a responsabilidade de ir à luta e não deixar que esse processo avance no nosso país, ou que passe impunemente sem nenhum tipo de resistência.
Por isso eu ressalto a greve de professores municipais porque ela foi importante para barrar um desses processos, que é a reforma da previdência, e que nós sabemos, ano que vem, independentemente do candidato à presidência que ganhar, eles vão querer avançar. Então, ou a gente vai à luta por uma escola laica, livre, com diversidade, que tenha debate de gênero, tenha respeito a diferentes orientações sexuais, diferentes identidades de gênero, que respeite os professores, que pague o salário, o piso nacional dos professores, porque aqui, por exemplo, no estado de São Paulo, não acontece. Ir à luta para que se aumente o piso salarial dos professores, que tenha investimento, que a gente consiga revogar a emenda constitucional 95, porque não dá mais para ter perdas bilionárias numa educação que já está precária, já está falida. Ou, de fato, a situação do nosso país vai ficar cada vez pior e mais entregue a esses que querem abocanhar os nossos direitos, destruir os direitos trabalhistas, e que não querem mais que nada seja consolidado como direto, como já acontece com alguns países do mundo.
Então, vamos à luta, não podemos deixar que nenhum desses processos aconteçam, não somente o Escola Sem Partido, mas todos os outros que têm o nome, talvez, menos assustador, mas que já estão em curso e que podem significar a perda da qualidade do ensino e da possibilidade do emprego de milhares e milhões de professores, que estão se formando nas disciplinas que não Português e Matemática; a mercantilização do trabalho docente e o fortalecimento dos grandes conglomerados.

DEBATE
ÁLVARO - MOGI
Queremos agradecer o professor Carlos, que é uma importante voz de apoio para a nossa luta e que sempre abre seu gabinete, seu mandato para as nossas demandas. Principalmente para o pessoal do Tiete que tem uma dirigente que é seguidora do Escola Sem Partido, inclusive, perseguindo funcionários, professores, diretores, com processos, por simplesmente questionar o papel dela antidemocrático na nossa região. Porém, nós estamos numa grande luta de reintegração de vários setores da educação, diretores, professores que foram exonerados por ela em Itaquá. Em Mogi, foi aberta uma sindicância por professores, que, inclusive, foram perseguidos por uma diretora a mando dela, porque simplesmente questionaram a redução de sala e a perda de uma vice-diretora, que era extremamente afinada com a comunidade escolar.
Agora a pergunta: como o mandato do professor Giannazi pode fazer uma ação por assédio, abuso de poder do agente público no Ministério Público? O parlamentar poderia fazer uma visita lá para fiscalizar as escolas da nossa região que estão em estado degradável, com obras abandonadas há mais de dez anos? A gente queria que o Carlos Giannazi pudesse fazer uma denúncia no Ministério Público e incluir na ALESP.

NÃO SE IDENTIFICOU
Primeiro, eu queria começar dizendo que essa fala da Escola Sem Partido me lembrou de uma afirmação do Paulo Freire, que educar é um ato, e queria jogar essa questão aqui para a gente pensar. Essa discussão da Escola Sem Partido é um tanto quanto esquizofrênica, por que para que ela seja aprovada precisa de partidos, então, uma coisa que é sem partido precisa de partido. Acho que isso é uma discussão que a gente tem que colocar, inclusive para a sociedade, ela tem aí um aspecto didático para a gente poder entender isso.
Há outras questões que aparecem como pano de fundo e que, às vezes, parecem que são naturais, por exemplo, a meritocracia é uma questão ideológica. A competição não é uma coisa natural do ser humano, uma categoria humana simplesmente, é algo construído socialmente, então, por que a escola tem que ser competitiva? A escola pode ser solidária. O professor falou aqui que estuda sobre a educação militar, a educação militar também é uma questão ideológica. E quero fazer uma última provocação, porque o tempo é curto aqui? Eu tenho a impressão que aqui somos maioria esquerda e a minha pergunta é a seguinte: será que nós sempre estamos na defensiva, para que temos sempre que nos explicar, é uma questão que parece que a gente está sempre perdendo, sempre atrás, queria entender um pouco esse processo.

RICARDO - GUARULHOS
Sou professor de Guarulhos, Itaquaquecetuba e acumulo duas diretorias. Antes de perguntar, queria afirmar que nós em Guarulhos derrotamos também o projeto escola com mordaça e não foi fácil, mas com muita mobilização a gente conseguiu ganhar do projeto na Câmara Municipal.  Dentro do ambiente de trabalho de vocês, aqui na ALESP, a senhora, na Câmara Municipal de São Paulo, diante desse cenário político às vésperas das eleições, há uma preocupação, em nível federal, com a possibilidade de emendas constitucionais, com o avanço dessa ala conservadora que se manifesta de diversas formas, nos três níveis de governo, há essa possibilidade de piora com a emenda, há esse tipo de discussão nos corredores no ambiente de trabalho de vocês? 

CARLOS GIANNAZI
Eu quero, antes de responder sobre o que perguntaram aqui, dar um olhar mais coletivo sobre o projeto de lei protocolado recentemente aqui na Assembleia Legislativa pelo Executivo, pelo governo, sobre o professor categoria O, mudando de novo a duzentena a quarentena. O projeto veio à Assembleia Legislativa e está em regime de urgência, nós já apresentamos a emenda. O projeto apenas prorroga a quarentena até o ano de 2020, só dois anos de quarentena, depois volta novamente a duzentena, é um paliativo, não resolve a ainda a situação dos professores categoria O. Logo que foi protocolado, nós apresentamos várias emendas, primeiro acabando com a interrupção do contrato, nós defendemos que se volte à situação anterior, a lei 1093 de 2009, onde não há interrupção, a não ser quando chega o professor efetivo concursado, que assume as aulas. Essa história de interrupção do vínculo empregatício é um absurdo total. Então, nós apresentamos emendas para tentar melhorar o projeto. O projeto do governo também não garante o IAMSPE, professor de categoria O continua não tendo direito, nossa emenda garante esse direito. Nós vamos disputar e, logicamente, não vai ser aprovado agora, estamos a 20 dias das eleições, então, ele só vai ser votado depois.
Sobre as perguntas levantadas, o professor Álvaro, combativo lá da região de Mogi, tem feito vários enfrentamentos participa ativamente aqui das nossas audiências públicas e, sobretudo da comissão da educação. Ele sempre traz denúncias aqui, porque a situação lá é grave mesmo. E o que acontece lá, acontece em várias regiões do estado, porque existe na rede estadual, um autoritarismo estrutural dentro da Secretaria da Educação, mas, principalmente nas diretorias de ensino, que são mais realistas do que o rei. Há uma tradição autoritária no aparelho burocrático das diretorias de ensino, é um processo de perseguição mesmo, muitos professores exonerados, afastados injustamente dos seus cargos. Nós fazemos, pela ALESP, muitas intervenções, não só acionando a nossa comissão de educação, convocando o secretário para depor, convocando dirigentes de ensino aqui nas comissões de Direitos Humanos, de educação, mas sobretudo acionando o Ministério Público Estadual em muitas situações. Então, o Álvaro tem trazido suas denúncias aqui e outros professores também. Depois você me passa o nome desses professores que foram agora perseguidos e exonerados, que vamos acionar o MP também.
Nós convocamos também o Secretário da Educação para depor em relação a outros fatos, como por exemplo, é altamente autoritário o que o Departamento de Perícias Médicas vem fazendo com os professores readaptados. É um crime, uma agressão à dignidade humana, à saúde e à vida dos professores readaptados. Estão cessando as readaptações e o professor é obrigado a voltar adoecido para a sala de aula, sem a mínima condição. Nós já acionamos o MP, que abriu, por conta da nossa representação, um inquérito civil e está convocando o secretário de gestão, educação.
Ainda em relação a esse fato, acionamos o Conselho Regional de Medicina, porque parece que é uma orientação do governo. O que o governo faz? Não está contratando professores, não faz a chamada do concurso, não contrata, então, está cortando o orçamento da educação, e obriga os professores readaptados a voltarem para a sala de aula, mesmo adoecidos. O mandato tem que fazer isso o tempo todo, tem que denunciar, cobrar, convocar o secretário. Se não funciona aqui na ALESP, vai ao MT, Tribunal de Contas, a gente tem que usar a tribuna para denunciar. Tornar público isso, às vezes, funciona quando você dá publicidade.
O professor Ricardo levantou uma questão que nós concordamos, a educação é ideológica para o bem ou para o mal, tudo é ideológico, e os conteúdos são ideológicos, qualquer conteúdo é ideológico, não há neutralidade na educação em nenhum aspecto. Eu fico perplexo porque os defensores do Escola Sem Partido, que estão dizendo por aí que nós estamos doutrinando os alunos, que somos marxistas, que somos formados dentro da filosofia de Paulo Freire, é isso que eles falam, que o Paulo Freire arruinou a educação brasileira. Eu falo assim, antes fosse, se todos nós fôssemos marxistas, se todos tivéssemos sido influenciados pelo Paulo Freire, o Brasil seria outro. O fato é que não existe isso, é só você entrar na sala de aula de uma escola pública ou privada, você sabe que há pouquíssimos professores fazendo a resistência, nós aqui não representamos o conjunto do professorado, somos uma exceção, vocês professores de Filosofia, os professores militantes. Porque quando você entra, no dia a dia, o cotidiano de uma escola, pessoal, vamos ser sinceros, eu sou professor, entrei na rede em 84, dei aula 20 anos na rede estadual, estou na rede municipal de ensino desde 85, eu sei o que é uma sala de aula, o que é uma sala de professor.
Na verdade, a educação brasileira é altamente doutrinadora, ela doutrina para a alienação, para a passividade. Agora, não contentes com isso, eles querem aprofundar esse tipo de educação, piorando, calando as poucas vozes que ainda existem, que são as nossas vozes, um absurdo total. Porque ela já é ideológica, a educação do sistema capitalista cumpre um papel de legitimar a desigualdade social, a dominação de classe social, as diferenças das desigualdades econômicas sociais, é para isso que serve a escola.  Agora, nós disputamos, entramos dentro dela para disputar esses conteúdos, nós queremos um outro tipo de escola. O Escola Sem Partido veio com esse tipo de história, que é um absurdo, se fosse isso, seria maravilhoso, se nós todos fôssemos marxistas, estivéssemos trabalhando Paulo Freire nas escolas, seria maravilhoso. Mas não é nada disso, ao contrário, mas mesmo isso eles não querem que a gente faça, nós somos poucos, a gente incomoda, por isso que eles criaram, sem dúvida nenhuma, o Escola Sem Partido.
Depois, a última pergunta sobre Guarulhos, parabéns, vocês derrotaram lá também com mobilização popular, eu acompanhei a luta de vocês na Câmara Municipal, onde vocês derrotaram o projeto inconstitucional do Escola Sem Partido. Olha, pessoal, o momento é sério, é grave do ponto de vista nacional e aqui em São Paulo também. A gente fica muito no nacional, aqui a situação é muito grave no estado de São Paulo. Nós temos dois candidatos, Dória e Skaf disputando, vai ser difícil reverter essa situação, teremos que optar entre Dória e Skaf no 2º turno, é o pior cenário possível o de São Paulo. No Estado não tem discussão nenhuma sobre Base Nacional Comum Curricular, a Secretaria da Educação não está estimulando isso e a situação pode piorar. O Alckmin já disse que o primeiro projeto dele, se ele for eleito, vai ser a reforma da previdência, vai intensificar as reformas contra os trabalhadores, contra o povo brasileiro. Não será diferente com Bolsonaro, e tem mais, vamos ser realistas aqui, mesmo Ciro Gomes, vai fazer reformas, talvez não na proporção que vem fazendo Temer, e mesmo o Haddad vai fazer reformas também, não nos iludamos aqui.
Agora, é lógico que nesse momento a gente tem que derrotar o mal maior, tem que pensar sempre nisso. Nós não podemos ter nem Alckmin, nem Bolsonaro, e aqui nem Dória, nem Skaf, porque não sei o que é pior. Então, pessoal, nesse cenário, só com muita mobilização popular, com resistência, o povo nas ruas, que a gente vai reverter essa situação. E para concluir a nossa grande luta hoje é pela revogação de todas as reformas, revogação contra a contrarreforma do Ensino médio, da reforma trabalhista, da lei da terceirização, da emenda 95, nós temos que revogar todas essas antirreformas contra o povo brasileiro, essa tem que ser a nossa luta nesse momento.

SÂMIA BONFIM
O nosso gabinete está sempre à disposição para receber qualquer demanda e indicação de vocês. A luta no parlamento é também uma trincheira muito importante para fazer enfrentamento. Acho que a greve dos servidores municipais é um exemplo de como a gente consegue conectar a luta das ruas com a luta do parlamento. Por isso, estamos juntos.

ALDO SANTOS
Eu queria deixar nas mãos da Sâmia o projeto Filosofia no Ensino Fundamental para que ela possa protocolar na Câmara Municipal de São Paulo, a exemplo do que Giannazi fez aqui na Assembleia Legislativa. E ao fazer isso, proponho que cada um de vocês aqui presente, o faça também na sua Câmara Municipal, para que a gente possa não só discutir a retirada, mas a ampliação da Filosofia. Nós não estamos com medo da retirada da disciplina do currículo, nós queremos é ampliar a Filosofia no ensino fundamental.

VANDA
Ouve-se muito falar de luta, que a situação é alarmante, de fato é. Nós precisamos, então, pensar num plano de ação. Sairemos aqui com que tipo de proposta? Porque nós professores estamos na sala de aula, o que faremos lá? Nós vamos acionar os secundaristas e animar esse movimento, vamos nos unir, qual a pauta que sai daqui? Ou sairemos mais uma vez cheios de ideias isoladas, cada um seguindo de modo isolado sem ter coerência de agir em conjunto? Eu gostaria que a gente pudesse ter um espaço para discutir o que vamos propor de ação, porque a situação é dramática, com a BNCC e a Escola Sem Partido. Nós vamos fazer o que, ficar parados, temos uma solução? Não, mas poderíamos aproveitar que estamos reunidos aqui para buscar qual seria essa ação.
Sempre que eu saio desse tipo de reunião, desses congressos, a gente ouve muita coisa, se empolga, vê que tem uma união de classe, mas nunca há uma pauta direcionada ou uma proposta. Não há uma discussão do que pode ser feito, como nós vamos atuar numa situação como essa? Seria bom se os organizadores da APROFFESP pudessem colocar um espaço para que a gente pudesse discutir sobre isso de modo mais ampliado.

ALFREDO - AMERICANA
No interior de São Paulo, já começou uma parceria entre as escolas militares e o Estado. Eles usam o discurso meritocrático e apresentam aos alunos principalmente a questão financeira, dizendo que um militar no início de carreira ganha um salário de 5 mil reais. Então, a primeira coisa que eles focam são os jovens da periferia desiludidos e usam esse discurso. O Escola Sem Partido, de alguma maneira, vem chegando e acontecendo, por exemplo, em Brasília foi aprovada Educação Moral e Cívica.
Hoje, nós falamos muito da questão de gênero, mas tem também a da intolerância religiosa, que tem sido bastante presente nas escolas, principalmente contra as religiões de matrizes africanas. Lá em Americana, em comemoração à Consciência Negra, tivemos uma apresentação e o pessoal foi fazer uma saudação, ocasião em que professores, dirigentes e pessoas presentes fizeram acusações e barraram uma palestra explicando sobre a religião, só que ninguém barra ninguém de entregar o novo testamento. Então, quer dizer, através dessas questões indiretas o Escola Sem Partido já está chegando e entrando.

WELINTON – SÃO PAULO LESTE 5
A reflexão que eu queria trazer é em torno de como se fortalece esse movimento contra as humanidades. Recentemente, a gente viu um projeto de iniciativa popular, aquelas enquetes no Senado e na Câmara, que pretendiam, inclusive, retirar as formações de humanidades das universidades públicas. E isso se fortalece muito em cima de um preconceito com relação à Filosofia, que gera medo e um acirramento. Preconceito que está fundamentado dentro da nossa realidade do estado de São Paulo.
A gente tem um currículo plural com todas as suas deficiências, que contempla a maioria das vertentes da tradição do pensamento, desde Platão, Agostinho, Tomás de Aquino, Locke, ou seja, a vertente liberal, a vertente marxista. Enfim, o nosso currículo é diversificado, é plural, então, a nossa escola não é uma escola de um partido, mas que tem várias partes. Nesse sentido, a gente precisa pensar ações e recuperar um pouco o que é a Universidade de São Paulo, um dos principais polos formadores do pensamento filosófico, num departamento extremamente plural, diversificado, onde você tem Marilena Chauí, Ricardo Terra, Giannotti, enfim, vertentes liberais. Mas só que nada disso chega a sociedade. Muitas vezes o discurso hegemônico daqueles que tem o poder dos meios de comunicação faz com que chegue a imagem de que o departamento de Filosofia é o lugar de marxistas e anarquistas. Então, eu acho que a pluralidade é uma forma de a gente se resguardar diante da sociedade, ela é uma riqueza da própria Filosofia que a gente tem o dever de zelar.  
Então, a minha reflexão é como a gente construir uma entidade que defenda e posicione a Filosofia, perante a sociedade, a partir da defesa da pluralidade. Na ideia de a gente criar espaços e vencer esses preconceitos, essas pechas que foram colocadas contra a gente e que não diz respeito. Porque quando eu estou ensinando o Locke, eu ensino o Locke pelo Locke, fiel às ideias dele, essa é a minha intenção, porque o aluno tem o direito a conhecer e ter acesso a esse pensamento. Então, é muito preconceito, e como a gente pode pensar, então, a nossa ação nesse sentido de posicionar a Filosofia, constituir, criar espaços que represente a diversidade da democracia e a diversidade de pensamento a partir da própria APROFFESP?

EDERSON – OSASCO
O que a gente está fazendo com as nossas produções, há muitos trabalhos legais, mas nem sempre ressoam na escola ou para nós da APROFFESP. Então, o que a gente pode fazer para que esses trabalhos sejam vistos, a exemplo do professor Marcos e demais que estão publicando livros? Que outros também possam se espelhar, que a gente possa constituir a grade curricular de Filosofia e não por outras que vem de fora. Porque isso vai dar um sentido maior de pertencimento.
Como a gente tem percebido a nossa influência na vida dos alunos? Porque a gente fica muito se importando com os colegas professores, que são vítimas também desse sistema do fracasso escolar, e se esquece que se numa sala conseguimos atingir 20 de 50 alunos, esses 20 serão frutos.

SADI
Há quem acha que os que acreditam no comunismo, no marxismo, são maconheiros, traficantes, gays, vagabundos e irresponsáveis. Por outro lado, o marxismo também leva a ideia extremista, um controle total, o comunismo, Stalin, Lenin, é uma imposição que tira a liberdade, uma coerção que não dá uma iniciativa livre, não existe a iniciativa privada, etc. Bom, coerção a toda a sociedade está na sociologia, é o princípio básico. Essa dualidade aparece, por exemplo, na Globo também, quando ela faz propaganda do agronegócio e que o agro é bom, para manter lá a reforma agrícola, mas não a reforma agrária né. Então, a gente vê todo esse jogo de contrários.
A respeito desse projeto de educação, que o pessoal diz que vai avançar, sobre a escola partidária, a gente não deve se preocupar, porque o professor é dono da sala de aula. Não adianta nenhuma reforma educacional, porque o professor vai passar o conteúdo que sabe, é ele que vai decidir, é o jeito dele, é o conhecimento dele, mal ou bem, ele vai fazer isso. A questão é burocrática, o que está nas leis, que os deputados e o legislativo criam, mas eles mesmos não obedecem e nem o judiciário. No julgamento do Lula não tratam o que ele fez, não, é uma discussão em cima da literatura jurídica. Então, na verdade, essa questão da mudança da educação, de lei e etc. não serve.

JOÃO
Sobre as escolas militares há dados ou pesquisas sobre algum tipo de projeto pedagógico, porque a gente ouve muito a questão da disciplina e tal, mas nada sobre dados em relação a pedagogia, os projetos que funcionam?

RESPOSTAS
JOTA MURATO
Inicialmente, vou falar um pouco sobre o que o Ricardo colocou lá atrás, ele colocava que a esquerda parece sempre estar perdendo. Quando a gente estuda sobre a ditadura militar, por exemplo, em 64, a impressão que se tinha é que também a esquerda estava perdendo, apesar de todos os movimentos. E essa impressão vinha justamente porque você não percebia uma unidade na esquerda. Então, eram vários discursos, vários movimentos e até um pouco antes de Jango cair ele não era unanimidade, muitos o chamavam de traidor do movimento dos trabalhadores. Jango teve que aguentar coisas que nós enxergamos hoje também acontecendo.
Essa falta de unidade dá a impressão de que sempre estamos perdendo, mas acho que é muito difícil a esquerda num país com capitalismo periférico, como o nosso, vir a perder ou desaparecer, porque o capitalismo aqui, dado as suas contradições, vai sempre deixar as massas empobrecidas, em situações de necessidade. Evidentemente, uma direita, com conservadorismo, nunca vai atender as necessidades, eles não querem, vão dar escolas militarizadas e por aí vai. Então, acho muito difícil a esquerda perder a força com o povo. Tem-se a impressão agora, mas também com muita reflexão, que dentro de um determinado tempo acaba se voltando às suas origens.
A Vanda colocou sobre a pauta, sobre a discussão da categoria mesmo, que eu acho muito legal e apoio, vocês precisam conversar entre si. O Alfredo colocou sobre a militarização no interior, que já tem parcerias, ainda não diretamente como se trabalha a escola militarizada, mas é um perigo de fato, a gente tem que ficar observando, como se busca e o que vai acontecer com isso. Trabalham meritocracia? Sim, a meritocracia é um valor muito forte do militarismo por isso tudo aqui que eles tiveram repassarão no meio educacional.
Então, é a meritocracia, é o dever, a propriedade, são coisas que eles colocam e a gente percebe no seu próprio regulamento no âmbito de comportamento. Então, qual é a ideia do militarismo ou das escolas militares? É mudar, docilizar comportamentos. Dentro da ótica de uma escola padrão pública que temos no Brasil, hoje, existe um comportamento tido como violento e incontrolável e eles querem mudar isso. Como um estado sem menor interesse em investir na origem do problema, na raiz, pode mudar alguma coisa? Da mesma forma que aumentam o número de viaturas, de policiais, de armas, cadeias e leis, por que não agem na prevenção primária da criminalidade e violência?
Eles trabalham bastante a questão da meritocracia, e é lógico, pegam aquele menino que está numa situação socioeconômica muito ruim, abrem perspectivas para ele, que entra naquele chamado canto da sereia, começa a sonhar, a pensar que há uma possibilidade para ele também.
O Wellington colocou a questão do movimento contra as humanidades, que há um bom tempo vem acontecendo. Para que humanidades num país como o nosso? Acho que essa é a grande questão, de olhar o sistema social em que vivemos, olhar para a história do Brasil, da República para cá e ver todos os movimentos feitos para que o povo fique, de fato, cada vez mais submetido e as elites sociais e políticas possam se prevalecer sobre isso. A nossa visão política é muito diferente de outros lugares do mundo, por conta de ser um capitalismo dependente.
Quando fiz Filosofia, estudando Althusser, achava que desmilitarizar as polícias seria a solução para que ficassem mais humanizadas, mais calmas. Só quando fui fazer mestrado percebi que isso não é garantia de elas se tornarem menos violentas, existe o aspecto da ruptura da condição da ditadura militar, que é necessário tirar o aspecto de homens e mulheres de guerra, para que possamos lhes passar conceitos de direitos humanos. Porque, enquanto houver essa alma neles, pode-se dar 200 horas de aula, que não entrará esse conceito para eles.
A polícia civil não é militar e reproduz as mesmas técnicas e métodos de violência que a ditadura militar. Os guardas civis municipais, que são formados hoje nos municípios, não são militares, mas já começam a reproduzir essa cultura, essas crenças e os hábitos. Então, o fim da violência é o nosso gargalo e a gente tem que pensar como resolver isso. Então, o que a gente vai fazer com a nossa autoria? Eu penso que é um convite, minha sugestão é ter um trabalho na escola e transformar isso, nem que seja numa literatura de cordel, já vai estar ajudando bastante.
O Sadi destacou a pecha que recai sobre os marxistas e o comunismo, O que vocês estão fazendo para contrapor isso? Porque essa é uma propaganda que vem atingindo um grande número de pessoas, inclusive nas redes sociais. Então, estava tudo lá “Fulano de tal foi pego por desvio de dinheiro” E eles diziam “Olha lá o que o safado do comunista ou socialista fez. ” Então, foi um trabalho muito intenso para que demonizasse o marxismo e o comunismo, porque já vinha a ideia da Escola Sem Partido, tudo o que eles querem é um povo dócil. De fato, se fala em partido, mas o único partido que se fala aí é o do capital das escolas, não existe outro. O marxismo e as ideias libertárias que possam vir são resistências apenas, como falou o deputado.
Quando a gente pensa num projeto pedagógico de inciativa da militarização o objetivo de quem administra a escola militarizada é docilizar os alunos, é tirar deles toda contestação, toda reflexão e trazer o respeito aos professores, principalmente em sala de aula, o respeito ao estado, às famílias e a tudo o que é institucionalizado, para o povo, tido como gente de bem. Essa é a função e o que precisa ser feito para que cheguem nisso e para que possam produzir também? Para eles, não há condições humanas de aprendizado na escola padrão devido a bagunça, ao crime, então a solução é militarização, porque com um militar lá terá regras que os alunos devem seguir e aqueles que não se adequarem estão fora, como era na época da ditadura militar.
Quantos amigos meus foram simplesmente expulsos da escola porque, num determinado momento, não aguentaram a pressão do professo. Então, essa é a lógica, trazer um novo tipo de comportamento, agora, essas escolas trouxeram de positivo? Temos que ver pelo lado dos pais, da sociedade na qual seus filhos estão. Eles estão colocando os filhos nessas escolas porque há uma diferença no comportamento desses alunos, dessas crianças e adolescentes. Os pais estão gostando também, porque é uma forma dessas crianças e adolescentes não se aproximarem do tráfico, da criminalidade e de tantas outras coisas.
Além da questão do mérito que se coloca na cabeça do aluno de que ele pode ser alguém de bem, com um trabalho razoável. Então, os pais estão apoiando bastante e grande parte dos alunos, em contrapartida, estão reclamando, dizendo que só vão para escola porque os pais obrigam, porque lá é muito chato, cheio de regra e de rigor. Se a menina esquece da estrela que deve ser afixada na boina, como aconteceu, ela não entra e receberá punições.
Esse é o sistema militar e a tendência é que essa ideologia passe a compor a vida da pessoa, o aluno vai se sentir militarizado 24 horas por dia, assim como o policial, que não se vê como um homem de guerra, mas como um herói da sociedade porque ele dá a vida. Fazer ele pensar que é um herói é excelente para o sistema, porque você terá um profissional que vai suportar maus pagamentos, condições de vida muito ruins, essa violência toda e todas essas contradições do estado e ele vai aceitar. Por que? Porque ele é um herói, o herói dá a vida e passa por cima de tantas coisas. Ele tem que fazer bicos, mas isso não importa, ele é um herói. Então, a tarefa de trazermos de volta à consciência de que são trabalhadores e não homens de guerra ou heróis, é árdua, mas tem que ser feita.
Se vocês acompanharem as redes sociais, a opinião dos policiais militares acerca de tudo isso que está havendo – Bolsonaro: bandido bom é bandido morto e todas essas rudezas que estão sendo divulgadas - vão perceber que 90% deles estão apoiando esse tipo de pensamento, o que é muito preocupante. Porque pensar numa instituição que tem 90% de pessoas que se veem representadas por tais pensamentos e ideias dá para imaginar como que é, de fato, essa corporação, como pensa e age.
O projeto pedagógico das escolas militares ainda segue o conteúdo conteudista. Como eu falei, em Goiás, em 2016, as sete primeiras escolas do ENEM eram todas militarizadas, o que é excelente do ponto de vista. Então, quer dizer que o desempenho dos alunos cresceu tanto assim? E é nessas escolas, então elas são maravilhosas? Para quem está fora sim, mas não podemos nos esquecer, que nelas não está sendo desenvolvida a cidadania. Os militares não gostam de cidadania plena, saibamos disso. Como alguém que não gosta de cidadania plena pode ser tutor do desenvolvimento da cidadania de alunos? Então, qual é o projeto deles? Dos militares é a mudança de comportamento e tomada da ideia, mentes e corações.
O projeto pedagógico, que seria aquilo que é da secretaria da educação mesmo, está indo bem, há desempenho, vão bem nos exames, reclamar do que? Agora, reclamam sim, porque uma escola militarizada gasta três vezes mais por aluno do que uma escola pública normal. Se o gasto aluno de escola pública normal é de 6 mil reais por ano, na escola militarizada ou militar chega a 18 mil reais. Para montar a estrutura essas escolas receberam recursos financeiros, o que trouxe revolta dos professores que não são militares, da rede normal, que dizem: “Manda esse dinheiro e material humano para nós que vamos mostrar a vocês que tipo de educação também somos capazes de fazer”. Então é uma concorrência desleal.

THIAGO – APROFFIB
Antes de encerrarmos, agradecemos imensamente, em nome da APROFFIB, que aqui represento. Só queria dizer que fizemos uma rápida conversa com a diretoria da APROFFIB sobre a fala da professora Vanda que destacou a necessidade de termos uma ação efetiva. Amanhã, por volta da hora do almoço, vamos nos organizar, para pensar ideias efetivas. 

4ª PLENÁRIA NACIONAL DA APROFFIB
ASSOCIAÇÃO DOS PROFESSORES DE FILOSOFIA E FILÓSOFOS DO BRASIL


 São Paulo, 13 de setembro de 201

Diretoria da Aproffib:

Aldo Santos - Presidente

Marcos da Silva e Silva-Vice - Presidente

Cristiano Leme - Secretário

Alan Aparecido Gonçalves-Tesoureiro

Tiago Rosa de Jesus Silva - Diretor de Comunicação

Valmir João Schmitt - Diretor articulador das Coordenações de base

Gentil Martins dos Santos - Diretor de Relações Sociais, sindicais e institucional

Suplentes:

José Mário de Freitas Medina Leal

Lúcia Aparecida Denardi

José Carlos Costa Hashimoto

Eulisses Gomes Bueno

Jerry Adriano Villanova Chacon

Contatos:
https://www.facebook.com/aproffib/
https://www.facebook.com/groups/aproffib/?source_id=1465042987147779
http://aproffib.org/
whatsapp:11.982505385- Aldo Santos



Nenhum comentário:

Postar um comentário