Nas aulas de filosofia, quando indagava algo sobre Sócrates, era comum os alunos fazerem referência ao Sócrates jogador de futebol, que deu significativa contribuição ao esporte e a democracia política, além de ser considerado um marco na luta pela democracia na história do futebol brasileiro.
Eu então reconhecia a sabedoria das respostas dos alunos e, ao mesmo tempo, iniciava a minha exposição sobre a história da filosofia, onde Sócrates de Atenas teve um papel fundamental na reflexão humana, significando para muitos autores um marco na história da filosofia entre os pré e pós-socráticos. Sócrates, filho de Sofrônico, escultor e de Fenareta, parteira, nasceu em Atenas (469-399 a.C.) e o que conhecemos dele teria sido escrito pelos seus discípulos, com destaque para Platão.
Para a escritora e filosofa Marilena Chauí, “sabemos que os poderosos têm medo do pensamento, pois o poder é mais forte se ninguém pensar, se todos aceitarem as coisas como elas são, ou melhor, como nos dizem e nos fazem acreditar que são”. Para os poderosos de Atenas, Sócrates tornara-se um perigo, pois fazia a juventude pensar. Por isso, eles o acusaram de desrespeitar os deuses, corromper os jovens e violar as leis. Levado à assembléia, Sócrates não se defendeu e foi condenado a tomar um veneno, a cicuta.
Por que Sócrates não se defendeu? “porque”, dizia ele, ”se eu me defender, estarei aceitando as acusações, e eu não as aceito. Se eu me defender, o que os juízes vão exigir de mim? Que eu pare de filosofar. Mas eu prefiro a morte a ter que renunciar à filosofia”. (Chauí, Marilena. Iniciação à Filosofia: volume único. pg.45 do capitulo 04. São Paulo: Ática, 2010)
O Sócrates de Atenas está consagrado na história da humanidade pela significativa contribuição do seu método dialógico, sua observação sagaz, sua ruptura com os ensinamentos conservadores de sua época.
Com a morte de Sócrates Brasileiro a mídia, os comentadores esportistas, o meio político e os movimentos sociais são levados a reconhecerem a valiosa contribuição que o mesmo desempenhou em relação ao futebol, a política brasileira, a resistência à ditadura, além de fazer escola com a implementação da democracia Corinthiana, uma verdadeira revolução em um setor onde os jogadores eram joguetes e uma espécie de objetos a serviço dos técnicos e dos interesses capitalistas da máfia do futebol.
No artigo de Daniele Pechi, dentre vários argumentos e respostas elucidativas sobre a democracia Corinthiana,duas indagações chamam atenção dos leitores: “Quais outros eventos da História do Brasil envolveram esporte e política?”
Ela responde que a: “Copa de 1970, em plena ditadura militar, o Brasil foi tricampeão mundial de futebol, ao levar a taça da Copa do Mundo do México, em 1970. Para muitos historiadores e pesquisadores do assunto, o futebol serviu para mascarar a realidade e colocar em segundo plano a violência praticada pelo Estado no período. Durante o governo Médici (1969-1974), um dos mais repressores do período militar, a campanha ufanista do "Pra frente, Brasil" tomou corpo. O slogan divulgava a ideia de um Brasil em pleno desenvolvimento, com a construção de usinas hidrelétricas e outras grandes obras e a seleção vitoriosa era a personificação do sonho desenvolvimentista. Em relação a pergunta inicial do título desse texto, todos precisamos saber: “Qual foi o papel de Sócrates na Democracia Corintiana? O jogador Sócrates Brasileiro Sampaio de Souza Vieira de Oliveira era o principal líder da Democracia Corintiana no chamado "braço operário" do movimento.
Ele foi o grande ideólogo do processo que envolvia os jogadores e a comissão técnica nas decisões do clube e o principal entusiasta da ideia de que o projeto de cidadania e gestão compartilhada que estava sendo implantado no Corinthians poderia se tornar uma ação maior.
Médico de formação, "doutor" Sócrates, como ficou conhecido, tinha interesse político em disseminar a ideia de democracia no Brasil em plena ditadura. Nos anos 1980, ele já era um grande ídolo do país e se engajou politicamente, inclusive na campanha das Diretas Já (movimento popular de reivindicação de eleições diretas para presidente do Brasil nos anos de 1983 e 1984). O jogador acreditava que por meio do futebol, esporte de grande apelo popular no país, ele poderia se tornar um canalizador de informações sobre a importância e a necessidade da democracia. Sócrates participou das Copas do Mundo de 1982 e 1986 e foi um dos maiores jogadores da história do Corinthians “(ler mais no texto: “Democracia Corinthiana, futebol e política” de Daniele Pechi, publicado na revista escolaabril.com.br/)
Ele contextualiza essa ação e lidera um processo que significou um marco na história da cultura esportista brasileira com reconhecimento mundial. Em nota, o MST se manifestou sobre a morte de Sócrates:
“MST lamenta a perda de Sócrates: Um homem que tinha fé no povo brasileiro
O Brasil perde um grande jogador de futebol e um cidadão comprometido com o povo brasileiro e com a classe trabalhadora.
O MST lamenta a morte do grande brasileiro Sócrates, que faleceu neste domingo (4/12/2011).
O nosso Movimento perde um amigo. A doença impediu Sócrates de visitar e conhecer a nossa Escola Nacional Florestan Fernandes, em Guararema (SP), que estava agendada, mas não aconteceu pelas internações.
Estamos todos muito tristes com a morte desse grande companheiro – os militantes corintianos do Movimento ainda mais Sócrates nos deixa um legado de dignidade e brasilidade, que serve de exemplo para todos os jogadores de futebol, esportistas, brasileiros e lutadores do povo.
Um homem que tinha fé no povo brasileiro e na mobilização popular como força para as grandes transformações necessárias para o nosso país. Um forte abraço a todos os familiares e amigos.” (Secretaria Nacional do MST Fonte: http://www.mst.org.br/node/12751 ).
Da mesma forma que a morte de Sócrates de Atenas certamente significou um momento de dor e reflexão para os seus discípulos, a morte do Sócrates Brasileiro num dia triunfal em que seu time predileto se consagrara campeão brasileiro, significou também dor, reflexão, além do reconhecimento público de milhões de brasileiros nos gramados e em todos grandes jornais do mundo.
Ao tentar responder o título do Texto , são várias as afirmativas sobre a definição sobre quem é filosofo. Vários teóricos se debruçam sobre essa polêmica, porém, uma contribuição bastante contextualizada elaborada por Antonio Gramsci vai levantar vários aspectos e caracterizações sobre o tema: “... cabe afirmar que todos os homens são filósofos” para deixar claro que todas as pessoas são potencialmente capazes de avançar de um “filosofar” espontâneo, assistemático, restrito ao senso comum, para um filosofar mais elaborado e rigoroso, semelhante ao praticado pelos filósofos especialistas. Para isso, é necessário que a filosofia e os filósofos estejam em permanente contato com o povo, a fim de ajudarem a promover um avanço cultural de massa e não apenas de pequenos grupos intelectuais.
Só através desse contato é que uma filosofia se torna “histórica”, depura-se de elementos intelectualistas de natureza individual e se transforma em “vida”. (texto elaborado especialmente para o caderno do professor, tendo por base a publicação de Gramsci, conforme bibliografia descrita na pg. 29 do caderno do professor de filosofia, 3ª série, volume 01 do ensino médio.)
Indubitavelmente, Sócrates Brasileiro assim como Sócrates de Atenas, são importantes filósofos de tempos distintos, com contribuições marcantes no processo de transformação das pessoas na sociedade. Ao empregar o método socrático da ironia e da maiêutica, Sócrates Brasileiro “interrogou”, questionou e levou grande parcela da sociedade a “conceberem suas próprias idéias”, inclusive questionando o papel e o uso ideológico do esporte na alienação das pessoas no nosso cotidiano. Inquestionavelmente, Sócrates faz parte do olímpico mundo dos grandes filósofos da humanidade.
Filosofar sempre é preciso!!!
Aldo Santos. Coordenador da APEOESP-SBC, Presidente da Associação dos Professores de Filosofia e Filósofos do Estado de São Paulo, Membro do Coletivo Nacional de Filosofia.
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