quinta-feira, 24 de maio de 2012
Sorria, você está sendo filmado até nos banheiros.
Em reportagem publicada pelo portal UOL, a mesma destacava a colocação de câmeras nos banheiros dos alunos na Escola Municipal Sebastiana Cobra, em São José dos Campos. A reportagem afirmava que o objetivo dessa vigilância é para rastrear o comportamento dos alunos e professores. Segundo a manifestação da entrevistada, “seria bom colocarem câmeras dentro das salas de aula para os pais terem acesso às imagens de casa e poderem monitorar as atitudes dos filhos e dos professores” (UOL noticias 03/04/2012 - 20h12).
Esse debate é profundamente invasivo no tocante a liberdade individual e coletiva, que visa promover o controle, a vigilância e o patrulhamento sobre eventuais adversários ou inimigos existentes no interior das unidades escolares.
Todos são vigiados: os bons alunos, os indisciplinados, eventuais delinquentes sob o mesmo argumento e a mesma lógica da existência de um inimigo em potencial. Para o senso comum, isso pode parecer ou representar alguma forma de alívio em saber e acompanhar o cotidiano educacional dos estudantes com espaço já delimitados no interior das unidades escolares.
No período da ditadura, o controle também existia de outras formas, tentando coibir a liberdade de expressão e de cátedra dos educadores e a livre manifestação dos alunos. Hoje de forma sofisticada, todos estão com suas condutas pessoais e ou coletivas sob suspeita pela vigilância dos agentes do Estado. Para as pessoas que sonham com outro mundo de liberdade e respeito à individualidade e a liberdade de cátedra, entendem que toda sociedade controlada, ocorre por conta dos interesses da classe dominante que tenta manter o controle pessoal e, consequentemente, o poder pela classe detentora dos meios de produção.
Esse tipo de sociedade totalitária foi descrita no livro de George Orwell: "Grande irmão" é a expressão usada por George Orwell para definir o controle exercido pelo regime totalitário em seu romance 1984 (escrito em 1948). Naquela história, os trabalhadores são manipulados a tal ponto que existe uma complexa "polícia do pensamento" que a todos vigia por meio de câmaras filmadoras. Pensar "errado" é um crime passível das mais violentas torturas. O correto, naquele romance, é "não pensar". Não por acaso, o personagem principal do livro tem como função em seu trabalho reescrever a história, apagar vestígios, mudar a escrita sobre o passado. (A autora é carlalssilva@uol.com.br professora Adjunta do Curso de História da UNIOESTE - Campus Mal. C.Rondon.http://www.unioeste.br/projetos/observatorio/texto_movimento_estudantil.asp)
Outro autor que deve ser lido e entendido é Michael Foucault, que estudou e de certa forma denunciou o controle social que se dá pelo macro e micro poder, e com a instalação das câmeras nas salas de aula,nos corredores e nos banheiros, fazem parte dessa “mico física do poder”.
Esse tema foi analisado e debatido nas nossas reuniões de Representantes de Escola na Subsede da Apeoesp de Sbcampo, a partir de denúncias e da investida da Secretaria Estadual de Educação, incentivando a colocação de câmeras nas salas de aulas, corredores e até em “banheiros”, como afirma a reportagem.
Felizmente, a esmagadora maioria dos professores presentes foram contrários a instalação desses instrumentos de controle sobre os educadores e educandos. Várias unidades escolares vêm enfrentando esse debate e, ao mesmo tempo, propõe que o governo contrate mais funcionários para assegurar o efetivo cumprimento do processo educacional e não substituí-lo pelo controle virtual como vem ocorrendo.
Vários professores e alguns diretores foram cooptados por essa nefasta política opressora que visa a implementação de medidas coercitivas e desrespeitadoras dos diretos humanos.
O espaço escolar é justamento esse espaço de formação, convivência, aprendizado de conteúdos propedêuticos, de valores éticos e morais que se aprendem nos ambientes de liberdade e não pelo medo de ser observado, ser olhado e examinado numa espécie de big brother educacional.
Uma importante contribuição contrária à implantação desses equipamentos coercitivos é o conteúdo do abaixo-assinado, subscrito por educadores da unidade escolar Prof. João Batista Bernardes abaixo transcrito: “Nós abaixo-assinados manifestamos nossa posição contrária à instalação de câmeras de vídeo nas salas de aula da E. E. Prof. João Batista Bernardes pelos seguintes motivos:
1 – Já existe na escola câmeras instaladas nos espaços externos a sala de aula (corredores e pátio) e avaliamos que isto não inibe efetivamente ações de indisciplina;
2 – Entendemos que o espaço escolar é lugar de discussão; produção de conhecimento e desenvolvimento de valores e que, portanto as ações de controle e diminuição de indisciplina passam necessariamente pela questão da formação da autonomia dos sujeitos e não pela coerção e controle;
3 – A escola deve distinguir-se dos demais espaços coletivos como shoppings e outros onde este sistema de vigilância por câmeras é prática comum. No âmbito escolar lidamos com um grupo conhecido de alunos e pais e entendemos que desenvolver ações conjuntas para a resolução de conflitos é mais eficaz do que esta ação;
4 – Por fim, considerando que a instalação de câmeras visa à proteção patrimonial e não a necessidade de vigiar os alunos, pois os mesmos se encontram na presença dos professores (as) nas salas de aula, medidas como estas seria violar, de forma ofensiva, o direito a liberdade de cátedra dos professores (as) garantido na Constituição Federal e causar constrangimentos, além de desrespeitar o direito à individualidade dos alunos garantido pelo ECA* sem acrescentar nenhuma melhoria no ensino-aprendizagem, tal qual esse espaço foi reservado.
*ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente):
Art. 17. O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.
Art. 18. É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor.”
Na reunião de Representantes de Escola, foi aprovado que esse conteúdo deveria ser divulgado como experiência promotora de resistência e luta contra essa famigerada “ação pedagógica” dos agentes do governo do Estado que ao invés de contratar mais funcionários, tentam enxugar a maquina pelo viés do controle e da repressão virtual.
Vamos reagir a essa forma de deseducação, de desrespeito a autonomia e a individualidade que vem sendo implantada pelo falido estado capitalista que usa de todas as ferramentas para agredir e controlar os seres que muitas vezes aprendem com seus erros e sonham com um mundo livre da opressão de classe e do controle capitalista do gênero humano.
Liberdade e autonomia para educadores e educandos já!!!
Aldo Santos. Coordenador da APEOESP-SBC, presidente da Associação dos Professores de Filosofia e Filósofos do Estado de São Paulo, membro do Coletivo Nacional de Professores de filosofia, Militante do Psol.
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