Oscar
Niemeyer, a Veja online e o Escaravelho
Leonardo
Boff
Teólogo,
filósofo e escritor.
Adital
10.12.12
- Brasil
Com a
morte de Oscar Niemeyer aos 104 anos de idade ouviram-se vozes do mundo inteiro
cheias de admiração, respeito e reverência face à sua obra genial,
absolutamente inovadora e inspiradora de novas formas de leveza, simplicidade e
elegância na arquitetura. Oscar Niemeyer foi e é uma pessoa que o Brasil e a
humanidade podem se orgulhar.
E o
fazemos por duas razões principais: a primeira, porque Oscar humildemente nunca
considerou a arquitetura a coisa principal da vida; ela pertence ao campo da
fantasia, da invenção e do lúdico. Para ele era um jogo das formas, jogado com
a seriedade com que as crianças jogam.
A
segunda, para Oscar, o principal era a vida. Ela é apenas um sopro, passageira
e contraditória. Feliz para alguns; mas, para as grandes maiorias, cruel e sem
piedade. Por isso, a vida impõe uma tarefa que ele assumiu com coragem e com
sérios riscos pessoais: a da transformação. E para transformar a vida e
torná-la menos perversa, dizia, devemos nos dar as mãos, sermos solidários uns
para com os outros, criarmos laços de afeto e de amorosidade entre todos. Numa
palavra, nós humanos devemos aprender a nos tratar humanamente, sem considerar
as classes, a cor da pele e o nível de sua instrução.
Isso foi
que alimentou de sentido e de esperança a vida desse gênio brasileiro. Por aí
se entende que escolheu o comunismo como a forma e o caminho para dar corpo a
este sonho, pois, o comunismo, em seu ideário generoso, sempre se propôs a
transformação social a partir das vítimas e dos mais invisíveis. Oscar Niemeyer
foi um fiel militante comunista.
Mas seu
comunismo era singular: no meu modo de ver, próximo dos cristãos originários
pois era um comunismo ético, humanitário, solidário, doce, jocoso, alegre e
leve. Foi fiel a esse sonho a vida inteira, para além de todos os avatares
passados pelas várias formas de socialismo e de marxismo.
Na
medida em que pudemos observar, a grande maioria da opinião pública mundial,
foi unânime na celebração de sua arte e do significado humanista de sua vida.
Curiosamente a revista VEJA de domingo, dedica-lhe 10 belas páginas. Outra
coisa, porém, é a revista VEJA online de 7 de dezembro com um artigo do blog do
jornalista Reinado Azevedo que a revista abriga.
Ele foi
a voz destoante e de reles mau gosto. Até agora a VEJA não se distanciou
daquele conteúdo totalmente contraditório àquele da edição impressa de domingo.
Entende-se porque a ideologia de um é a ideologia do outro. Pouco importa que o
jornalista Azevedo, de forma confusa, face às críticas vindas de todos os
lados, procure se explicar. Ora se identifica com a revista, ora se distancia,
mas finalmente seu blog é por ela publicado.
Notoriamente,
VEJA se compraz em desfazer as figuras que melhor mostram nossa cultura e que
mais penetraram na alma do povo brasileiro. Essa revista parece se envergonhar
do Brasil, porque gostaria que ele fosse aquilo que não é e não quer ser: um
xerox distorcido da cultura norte-americana. Ela dá a impressão de não amar os
brasileiros, ao contrário expõe ao ridículo o que eles são e o que criam. Já o
titulo da matéria referente a Oscar Niemeyer da autoria de Azevedo, revela seu
caráter viciado e malevolente: "Para instruir a canalha ignorante. O gênio
e o idiota em imagens”. Seu texto piora mais ainda quando se esforça,
titubeante, em responder às críticas em seu blog do dia 8/12 também na VEJA
online com um título que revela seu caráter despectivo e antidemocrático:
"Metade gênio e metade idiota- Niemeyer na capa da VEJA com todas as
honras! O que o bloco dos Sujos diz agora?” Sujo é ele que quer contaminar os
outros com a própria sujeira de uma matéria tendenciosa e injusta.
O que se
quer insinuar com os tipos de formulação usados? Que brasileiro não pode ser
gênio; os gênios estão lá fora; se for gênio, porque lá fora assim o
reconhecem, é apenas em sua terceira parte e, se melhor analisarmos, apenas
numa quarta parte. Vamos e venhamos: Quem diz ser Oscar Niemeyer um idiota
apenas revela que ele mesmo é um idiota consumado. Seguramente Azevedo está
inscrito no número bem definido por Albert Einstein: ”conheço dois infinitos: o
infinito do universo e o infinito dos idiotas; do primeiro tenho dúvidas, do
segundo certeza”. O articulista nos deu a certeza que ele e a revista que o abriga
possuem um lugar de honra no altar da idiotice.
O que
não tolera em Oscar Niemeyer que, sendo comunista, se mostra solidário,
compassivo com os que sofrem; que celebra a vida; exalta a amizade e glorifica
o amor. Tais valores não cabem na ideologia capitalista de mercado, defendida
por VEJA e seu albergado, que só sabe de concorrência, de "greed is good”
(cobiça é coisa boa), de acumulação à custa da exploração ou da especulação, da
falta de solidariedade e de justiça em nível internacional.
Mas não
nos causa surpresa; a revista assim fez com Paulo Freire, Cândido Portinari,
Lula, Dom Helder Câmara, Chico Buarque, Tom Jobim, João Gilberto, frei Betto,
João Pedro Stédile, comigo mesmo e com tantos outros. Ela é um monumento à
razão cínica. Segue desavergonhadamente a lógica hegeliana do senhor e do
servo; internalizou o senhor que está lá no Norte opulento e o serve como servo
submisso condenado a viver na periferia. Por isso tanto a revista quanto o
articulista revelam um completo descompromisso com a verdade daqui, da cultura
brasileira.
A figura
que me ocorre deste articulista e da revista semanal, em versão online, é a do
escaravelho, popularmente chamado de rola-bosta. O escaravelho é um besouro que
vive dos excrementos de animais herbívoros, fazendo rolinhos deles com os
quais, em sua toca, se alimenta. Pois algo semelhante fez o blog de Azevedo na
VEJA online: foi buscar excrementos de 60 e 70 anos atrás, deslocou-os de seu
contexto (ela é hábil neste método) e lançou-os contra Oscar Niemeyer. Ela o faz
com naturalidade e prazer, pois, é o meio no qual vive e se realimenta
continuamente. Nada de surpreendente, portanto.
Paro por
aqui. Mas quero apenas registrar minha indignação contra esta revista, em
versão online, travestida de escaravelho por ter cometido um crime lesa-fama.
Reproduzo igualmente dois testemunhos indignados de duas pessoas respeitáveis:
Antonio Veronese, artista plástico vivendo em Paris e João Cândido Portinari,
filho do genial pintor Cândido Portinari, cujas telas grandiosas estão na
entrada do edifício da ONU em Nova York e cuja imagem foi desfigurada e
deturpada, repetidas vezes, pela revista-escaravelho
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