Associação dos Professores
de Filosofia e Filósofos do Estado de São Paulo
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TEXTO 1
Conjuntura
educacional*
No livro ”Organização política e
política de quadros”, de Ademar Bogo, publicado pela expressão popular,
primeira edição de 2011, o autor traça um itinerário da situação política tendo
como marco a queda do muro de Berlim em 1989, aponta os variados desmontes
organizativos e numa descrença efetiva de mudanças revolucionárias, onde
muitos bateram em retirada , outros tentaram repetir os formatos organizativo
historicamente construído, levando a um distanciamento não só das práticas
políticas transformadoras, mas também da teoria que interpretava corretamente
o movimento das contradições históricas. Ainda segundo o autor, Lenin viveu
este dilema, classificado como “ondas”, afirmando que “Nos períodos pacíficos,
que fazem parte da pré-revolução e podem durar décadas, a marcha é lenta. Nos
períodos revolucionários - curtos e rápidos - as massas e todas as forças
querem decidir logo as disputas”. Entretanto, nos dias atuais, todos os agentes
e interlocutores que lutam por um mundo novo sofrem e ficam confusos, pois
parece que nossos chamados e apelos são vagos e caem no vazio, sem a devida
ressonância ou resposta efetiva da sociedade em que vivemos.
Guardadas as devidas
especificidades, lembra muito o mito grego de Sísifo. O que é “trabalho de
Sísifo”: trabalho de Sísifo é uma expressão popular originada da mitologia
grega, remetendo a todo tipo de trabalho ou situação que é interminável e
inútil. O significado contemporâneo desta frase está relacionado com a ideia de
que por mais trabalho e esforço que se faça em relação a algo, os resultados
são sempre infrutíferos, irrelevantes e frustrantes. Alguns estudiosos, como o
escritor e filósofo francês Albert Camus, utilizavam dos princípios do trabalho
de Sísifo na mitologia grega para explicar algumas características da condição
humana. A vida dos seres humanos, segundo Camus, seria semelhante ao trabalho
de Sísifo, pois vivem para seguir uma rotina diária e repetitiva de atividades,
normalmente sem um propósito concreto, tornando-a um absurdo. (https://www.significados.com.br/trabalho-de-sisifo/).
Ainda conforme Bogo, “com a
demora em surgir a nova onda de ascenso, muitas entidades historicamente
respeitadas se burocratizam, se atrasam ideologicamente e perdem a noção dos
desafios estratégicos, tornando-se conservadoras na linguagem e desatualizada
no conteúdo político”. (pág. 11-12).
No livro de Emir Sader, Século XX
uma biografia não autorizada, publicado pela Editora Perseu Abramo, 2ª edição -
2010, ele afirma que “O século XX se anunciava como o século do socialismo e
termina com a consolidação da hegemonia do capitalismo, e em sua forma mais
selvagem: ideologia norte-americana, neoliberalismo econômico, dominação do
capital especulativo, do consumismo, do egoísmo, da predação ambiental”. Que
século foi esse, então, que combinou desenvolvimento tecnológico com
concentração de renda, enfraquecimento dos laços da sociabilidade, com
hegemonia dos grandes meios de comunicação de massa de caráter monopolista?
Nessa obra, Emir Sader analisa em profundidade essas questões, retomando
conceitos e ideias que permitem uma abrangente compreensão do “século do
imperialismo”.
Já o início do XXl o mesmo está
marcado pelo avanço de forças reacionárias, fome alarmante no continente
africano e em várias partes do mundo, além do cerceamento (ideológico,
econômico, militar) de países nas Américas que tentam romper com a lógica
capitalista que nos condena à pobreza e dominação desde os tempos da
colonização.
No Brasil não é diferente, pois,
com os avanços e poucas conquistas que lutamos durante décadas, estão
sendo destruídas por este governo, que se apoia nas instituições mantenedoras
da ordem positivista do estado burguês. Ordem para quem? Progresso para
quantos?
A sinalização da intervenção
militar no Rio de janeiro, como disse os representantes do Exército, é um
laboratório para o restante do país. Portanto, estamos num momento de
retrocesso e descenso da classe, com a esquerda fragmentada que em nada se
renova, tendo como ponto de apoio as entidades e partidos que por anos
pactuaram com a burguesia, cuja herança é o mesmo poder existente dominador das
elites que sempre se serviram do Estado brasileiro para perpetuar seus privilégios
e “negócios”.
Achar que somente um partido, que
esteve no poder recentemente, foi o criador das práticas de corrupção no Brasil
é muita ingenuidade, ou uma atitude de má fé para desviar a atenção da
população das causas estruturais e endêmicas que corroem a nação brasileira há
muitas décadas, senão séculos! E se a questão é política, não será o Poder
Judiciário, com seus juízes e desembargadores apinhados de privilégios e/ou o
Ministério Público que irão acabar com a corrupção no país, agindo como savonarolas
da pós-modernidade! Somente intervenções políticas transformam a Política!
No âmbito da educação, além da reforma do Ensino médio e da desestruturação da
educação pública no Brasil em todas as esferas, a Base Nacional Comum Curricular
deve ser publicada em breve, trazendo apenas a Matemática e a Língua Portuguesa
como disciplinas formais e obrigatórias; as demais disciplinas ficarão
condenadas ao ostracismo e segregadas pelos governantes aliados dos grandes
grupos empresariais de educação e sua lógica neotecnicista e de mercado. Ora,
para nós a educação de qualidade não é mercadoria, mas um direito de todas as
crianças e jovens brasileiros.
Nossos desafios são monumentais e vai precisar ter muita ousadia para continuar
lutando contra este estado de coisas. Precisamos arrancar das lições do passado
a memória revolucionária, fazer o enfrentamento no presente e resgatar a poesia
e a utopia perene de nossas lutas. Não podemos ceder ao pessimismo e derrotismo
dos sísifos atuais que nos paralisam e nos matam.
A filosofia tem um papel
fundamental nesta narrativa e no contexto que nos faz compreender
criticamente a realidade e suas interpretações, assim com as ciências humanas e
demais excluídas da Base Nacional Comum. Precisamos reunir as excluídas
urgentemente para pressionar o MEC através dos governos dos estados a fim de
que possamos sobreviver a este tsunami político-educacional conservador e
reacionário.
Por fim, neste mês das mulheres,
é fundamental nosso compromisso com a conscientização da sociedade em que
vivemos, onde ainda impera o machismo, as atrocidades contra as mulheres e o
feminicídio naturalizado.
Precisamos também aprofundar o
debate teórico dos clássicos a partir de uma leitura da sociedade dividida em
classes antagônicas, sendo que a felicidade humana não existirá sem o fim do
capitalismo que explora, oprime e mata, desde o início e no mundo inteiro, os
que vivem do trabalho e teimam em sobreviver mesmo quando o próprio direito ao
trabalho lhes é tirado. “E sem o seu trabalho o Homem não tem honra e sem a sua
honra se morre, mata, não dá pra ser feliz” (Gonzaguinha).
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*Aldo Santos é presidente da
APROFFIB - Associação dos Professores de Filosofia e Filósofos do Brasil;
vice-presidente da APROFFESP; coordenador da subsede da APEOESP - São Bernardo
do Campo, SP.
*Colaboração: Chico Gretter,
presidente da APROFFESP, conselheiro estadual da APEOESP, professor de
Filosofia da rede estadual, mestre em Filosofia e História da Educação.
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