Organizador: Kabengele Munanga,
Professor do Departamento de Antropologia da USP.
APRESENTAÇÃO
Com efeito, sem assumir nenhum complexo de culpa, não podemos esquecer que somos produtos de uma educação eurocêntrica e que podemos, em função desta, reproduzir consciente ou inconscientemente os preconceitos que permeiam nossa sociedade.
Não precisamos ser profetas para compreender que o preconceito incutido na cabeça do professor e sua incapacidade em lidar profissionalmente com a diversidade, somando-se ao conteúdo preconceituoso dos livros e materiais didáticos e às relações preconceituosas entre alunos de diferentes ascendências étnico-raciais, sociais e outras, desestimulam o aluno negro e prejudicam seu aprendizado.
Todos, ou pelo menos os educadores conscientes, sabem que a história da população negra quando é contada no livro didático é apresentada apenas do ponto de vista do “Outro” e seguindo uma ótica humilhante e pouco humana. Como escreveu o historiador Joseph Kizerbo, um povo sem história é como um indivíduo sem memória, um eterno errante. Como poderia ele então aprender com facilidade? As consequências de tudo isso na estrutura psíquica dos indivíduos negros são incomensuráveis por falta de ferramentas apropriadas. Mas elas existem certamente e devem, como mostra bem Franz Fanon no seu livro Pele Negra, Máscaras Brancas, prejudicar o sucesso escolar do aluno negro e de outros submetidos ao mesmo tratamento.
O resgate da memória coletiva e da história da comunidade negra não interessa apenas aos alunos de ascendência negra. Interessa também aos alunos de outras ascendências étnicas, principalmente branca, pois ao receber uma educação envenenada pelos preconceitos, eles também tiveram suas estruturas psíquicas afetadas.
Apesar da complexidade da luta contra o racismo, que consequentemente exige várias frentes de batalhas, não temos dúvida de que a transformação de nossas cabeças de professores é uma tarefa preliminar importantíssima.
O presente livro vem somar-se à contribuição de cada um de nós. Seus esforços são dirigidos à luta contra os preconceitos e a discriminação, que atingem cerca de 50% da população brasileira composta de negros. Outros especialistas com conhecimento da realidade das sociedades indígenas, das relações de gêneros, dos homossexuais, dos portadores de deficiência e outras vítimas da sociedade devem fazer o mesmo esforço. Os caminhos não são separados nem solitários, mas a especificidade exige abordagens diversas sem perder o rumo do diálogo e da troca de experiência.
A DESCONSTRUÇÃO DA DISCRIMINAÇÃO NO LIVRO DIDÁTICO.
Ana Célia da Silva Professora Assistente do Departamento de Educação da Universidade do Estado da Bahia – UNEB. Doutoranda em Educação da Universidade Federal da Bahia – UFBA
A presença do negro nos livros, frequentemente como escravo, sem referência ao seu passado de homem livre antes da escravidão e às lutas de libertação que desenvolveu no período da escravidão e desenvolve hoje por direitos de cidadania, pode ser corrigida se o professor contar a história de Zumbi dos Palmares, dos quilombos, das revoltas e insurreições ocorridas durante a escravidão; contar algo do que foi a organização sócio-político econômica e cultural na África pré-colonial; e também sobre a luta das organizações negras, hoje, no Brasil e nas Américas.
Desconstruindo os estereótipos de feio, sujo e mau.
A cor negra aparece com muita frequência associada a personagens maus: “O negro associado à sujeira, à tragédia, à maldade, como cor simbólica, impregna o texto com bastante frequência” (ROSEMBERG, p. 84). A criança que internaliza essa representação negativa tende a não gostar de si própria e dos outros que se lhe assemelham.
A quadrinha popular “boi da cara preta, pega o menino que tem medo de careta” foi corrigida assim: o boi da cara preta tem uma cara bonita, não é uma careta; o boi da cara preta é irmão do boi da cara branca, do boi da cara malhada. O boi da cara preta tem a cor do rosto da mamãe, o rosto que você, criança, se alegra quando olha... (ANDRADE, 1989, p. 8).
As denominações e associações negativas em relação à cor preta podem levar as crianças negras, por associação, a sentirem horror à sua pele negra, procurando várias formas de literalmente se verem livres dela, procurando a “salvação”no branqueamento. Guimarães (1988, p. 71), numa narrativa biográfica, ilustra uma dessas tentativas: A idéia me surgiu quando minha mãe pegou o preparado e com ele se pôs a tirar da panela o carvão grudado no fundo. (...) eu juntei o pó restante e com ele esfreguei a barriga da perna. Esfreguei, esfreguei e vi que, diante de tanta dor; era impossível tirar todo o negro da pele. Identificar e corrigir a ideologia, ensinar que a diferença pode ser bela, que a diversidade é enriquecedora e não é sinônimo de desigualdade, é um dos passos para a reconstrução da auto-estima, do auto-conceito, da cidadania e da abertura para o acolhimento dos valores das diversas culturas presentes na sociedade.
Acredito que é possível formar o professor de Ensino Fundamental, no sentido de utilizar de forma crítica o livro didático, transformando esse livro em um instrumento gerador de consciência crítica. A desconstrução da ideologia que desumaniza e desqualifica pode contribuir para o processo de reconstrução da identidade étnico/racial e auto-estima dos afro-descendentes, passo fundamental para a aquisição dos direitos de cidadania. A desconstrução da ideologia abre a possibilidade do reconhecimento e aceitação dos valores culturais próprios, bem como a sua aceitação por indivíduos e grupos sociais pertencentes a outras raças/ etnias, facilitando as trocas interculturais na escola e na sociedade. Corrigir o estigma da desigualdade atribuído às diferenças constitui-se em tarefa de todos e já são numerosos os que contribuem para atingir esse objetivo. A presença do Movimento Negro, nessa tarefa, recontando a história do negro na África e no Brasil, desde a formação de grupos organizados há séculos, reivindicando educação para os negros por meio de manifestos, teatro, música e ação sistemática junto aos órgãos de ensino, não pode ser esquecida. A aproximação das escolas com o Movimento Negro, que já possui uma larga experiência nesse trabalho de reconstrução e reposição do processo histórico-cultural dos afro-descendentes na educação, possibilitou a inserção, nos currículos de muitas escolas brasileiras, da tradição cultural e histórica desse povo. E torna-se mais necessária agora, que o tema transversal.
Com a certeza de que, por sua importância, esse tema, bem como os demais temas transversais, tornar-se-ão constituintes dos currículos e possibilitarão em breve a participação de todos na tarefa de promover o amor a si e ao próximo, estamos dando e apontando os primeiros passos. Como escreveu Steve Biko, “o primeiro passo é fazer com que o negro se encontre a si mesmo, insuflar novamente a vida em sua casca vazia, infundindo nele o orgulho e a dignidade”.
HISTÓRIA E CONCEITOS BÁSICOS SOBRE O RACISMO E SEUS DERIVADOS
Antônio Olímpio de Sant, Ana Especialista em Educação. Mestre em Teologia pela Universidade da Rainha – Kingston, Ontário/Canadá.
Prezado (a) professor (a), as relações raciais são um dos temas mais complexos dos dias atuais, e o racismo, como ele se apresenta hoje, é um fenômeno relativamente novo. É bom lembrar que nos tempos primitivos, até por volta da Idade Média, a discriminação baseava-se em fatores religiosos, políticos, nacionalidade e na linguagem, e não em diferenças biológicas ou raciais como acontece hoje. Era o “fiel” contra o “pagão”, o “cristão” contra o “muçulmano” ou mesmo contra o “judeu”. Observe, portanto, que o motivo era religioso, de nacionalidade, etc, mas nunca racial.
Quando qualquer pessoa no Brasil fala em racismo, qual é imagem humana que geralmente lhe vem logo de cara à mente? Acertou: é a do negro. Por que isso acontece? Por que o negro é a vítima maior do racismo praticado neste imenso país? Existe alguma relação entre a escravidão imposta ao negro e o racismo sofrido por ele? Um grande estudioso deste assunto chamado Ben Marais, em sua obra Racismo e Sociedade, declara que há uma relação muito próxima entre o escravidão a que foram submetidos os negros e a recusa às pessoas de cor negra... ‘O estigma em relação aos negros tem sido reforçado pelos interesses econômicos e sociais que levaram os povos negros à escravidão’. Daí o negro ter se convertido em símbolo de sujeição e de inferioridade.E este conceito negativo sobre o negro foi forjado (RUIZ, 1988, p. 100).
O racismo, como ideologia elaborada, é fruto da ciência europeia a serviço da dominação sobre a América, Ásia e África. A ideologia racista se manifesta a partir do tráfico escravo, mas adquire o status de teoria após a revolução industrial europeia. Aimé Césaire, em seu Discurso sobre o Colonianismo, escrito no imediato do pós-guerra, salienta que Cortez e Pizarro pilhavam e matavam na conquista da América, mas que nunca afirmaram “ser mandatários de uma ordem superior”... os hipócritas só vieram mais tarde (Ibidem).
Na Grécia antiga tinha-se como certo e definido que todos aqueles que não pertencessem à sua raça eram classificados como bárbaros. E é de Heródoto a afirmação que os persas consideravam-se a si mesmos superiores ao resto da humanidade. Aristóteles dizia que uma parte dos homens nasceu forte e, resistente, destinada expressamente pela natureza para o trabalho duro e forçado. A outra parte – os senhores, nasceu fisicamente débil; contudo, possuidora de dotes artísticos, capacitada, assim, para fazer grandes progressos nas ciências filosóficas e outras (GRIGULEVICH, 1983, p. 105). Essa hipótese foi usada no século XV; como veremos adiante, para justificar a escravidão dos indígenas e dos negros.
Em 1510, o dominicano escocês John Major, segundo nos informa Juan Comas, declarou que “a própria ordem da natureza explica o fato de que alguns homens sejam livres e outros escravos. Esta distinção deveria existir no interesse mesmo daqueles que estão destinados originalmente a comandar ou a obedecer” (Idem, ibidem, p. 14).
Entre 1550 e 1551, ressurge o debate através do confronto entre dois padres. De um lado, Frei Juan Ginés de Sepúlveda que, representando a ideologia colonialista, dizia que os indígenas tinham uma natureza inferior, sendo viciosa, irracional. Sepúlveda dizia que a relação que existia entre um espanhol e um índio era a mesma que existia entre um homem e um macaco. Em outras palavras, ele comparava o índio ao macaco, a um animal irracional. Com isso, ele queria dizer que os nossos irmãos indígenas do passado tinham que ser conquistados, “protegidos” e “tutelados”. De outro lado, estava o Frei Bartolomeu de Las Casas que, demonstrando mais simpatia pelos indígenas, propôs a substituição destes pelos negros, afirmando serem estes mais fortes e adaptáveis ao trabalho duro. E a sugestão de Las Casas foi fielmente seguida pelos conquistadores, incentivados e reforçados pela teoria de Aristóteles, que afirmava que algumas pessoas nasceram naturalmente para serem escravas e outras para serem livres: Esta discussão teológica foi-se estendendo a toda a humanidade, à medida que as nações européias iam ampliando o seu domínio territorial até novas regiões. Já não bastava desumanizar e negar a humanidade aos índígenas para justificar a conquista e a fortíssima e deplorável exploração dos mesmos. Havia, agora, de justificar o novo sistema escravista no qual envolveram os negros áfrica.
V. de Lapouge, um dos expoentes teóricos dos racistas franceses, apresentava a história da humanidade como uma luta entre as raças, na qual ficava evidente a superioridade da “raça branca” sobre a “raça negra” e a “raça indígena”.
Já outro historiador francês, C. Seignobos, difundiu a idéia de que os negros eram inferiores e precisavam de tutela e a orientação dos povos brancos, exatamente como as crianças precisavam dos adultos.
Exatamente por causa do tremendo incômodo que muitos negros e negras sentem por causa da cor de sua pele é que se desenvolveu no interior de muitos negros e negras a branquitude, revelada nas pesquisas feitas e resumidas neste trabalho, cujos resultados devem ajudar o(a) professor(a) a compreender a importância de sua participação consciente na luta e combate ao racismo, preconceitos e discriminações em sua esfera de atuação.
“Racismo é uma ideologia que postula a existência de hierarquia entre os grupos humanos” (Programa Nacional de Direitos Humanos, 1998, p. 12). Pode ser definido também como a teoria ou idéia de que existe uma relação de causa e efeito entre as características físicas herdadas por uma pessoa e certos traços de sua personalidade, inteligência ou cultura. E, somados a isso, a noção de que certas raças são naturalmente inferiores ou superiores a outras (BEATO, 1998, p. 1).
Origem da palavra racismo
Paulette Marquer, em seu livro As Raças Humanas, diz que a palavra raça vem do italiano razza, que significa família, ou grupo de pessoas. Por outro lado, continua Marquer, a palavra razza vem do árabe ras, que quer dizer origem ou descendência (DUNCAN, 1988, p. 15). Racismo, preconceito e discriminações são temas de veiculação crescente em nossa imprensa. Com isso, aumentam-se os debates, incentivando a discussão destes temas dentro e fora da escola.
Preconceito é uma opinião preestabelecida, que é imposta pelo meio, época e educação. Ele regula as relações de uma pessoa com a sociedade. Ao regular, ele permeia toda a sociedade, tornando-se uma espécie de mediador de todas as relações humanas. Ele pode ser definido, também, como uma indisposição, um julgamento prévio, negativo, que se faz de pessoas estigmatizadas por estereótipos. Aqui está uma lista de alguns preconceitos clássicos, que estão bem inculcados em nosso cotidiano: “Toda sogra é chata” “Todos os homens são fortes” “Toda mulher é frágil” “Todos os políticos são corruptos” “Toda criança negra vai mal na escola” “O negro é burro” “Mulher bonita é burra” Com base em estereótipos, as pessoas julgam as outras. Por isso o preconceito é um fenômeno psicológico. Ele reside apenas na esfera da consciência e/ou afetividade dos indivíduos e por si só não fere direitos. Ninguém é obrigado a gostar de alguém, mas é obrigado a respeitar os seus direitos (Conselho Estadual da Condição Feminina, 1994, p. 2):
Discriminação racial, segundo conceito estabelecido pelas Nações Unidas (Convenção da ONU/1966, sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial), significa qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferências baseadas em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica, que tenha como objeto ou efeito anular ou restringir o reconhecimento, o gozo ou exercício, em condições de igualdade, os direitos humanos e liberdades fundamentais no domínio político, social ou cultural, ou em qualquer outro domínio da vida pública.
Gênero é um conceito que se refere ao conjunto de atributos negativos ou positivos que se aplicam diferencialmente a homens e mulheres, inclusive desde o momento do nascimento, e determinam as funções, papéis, ocupações e as relações que homens e mulheres desempenham na sociedade e entre eles mesmos. Esses papéis e relações não são determinados pela biologia, mas sim, pelo contexto social, cultural e político, religioso e econômico de cada organização humana, e são passados de uma geração a outra.
Estereótipo é um conceito muito próximo do de preconceito e pode ser definido, conforme Shestakov, como “uma tendência à padronização, com a eliminação das qualidades individuais e das diferenças, com a ausência total do espírito crítico nas opiniões sustentadas” (Idem, ibidem, p. 2). Segundo Lise Dunningan, o “estereótipo é um modelo rígido e anônimo, a partir do qual são produzidos, de maneira automática, imagens ou comportamentos” (Idem, ibidem, p. 2-3). O estereótipo é a prática do preconceito
O DIREITO A DIFERENÇA.
Glória Moura Professora do Departamento de Artes Cênicas e Coordenadora do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros da Universidade de Brasília
O currículo escolar geralmente não leva em conta essa experiência do aluno e, ao impor-se como única forma legítima de saber no interior do processo formal de educação, acaba por esconder sob sua aparência de universalidade um outro currículo, que Apple, estudioso da ideologia que atravessa o currículo escolar, chama de currículo oculto: são as cadernetas de freqüência, os sinais de entrada e saída que devem ser obedecidos, a disciplina imposta na sala de aula, o sistema de recompensas e castigos, etc., que não são admitidos como parte do currículo, embora toda a experiência escolar dos alunos, seja regida pelos verdadeiros rituais que se organizam em torno destas formas de controle. É necessário deixar clara a diferença entre currículo invisível e currículo oculto, conceito pedagógico sistematizado. O que chamamos de currículo invisível é a transmissão dos valores, dos princípios de conduta e das normas de convívio, ou, numa palavra, dos padrões sócio-culturais inerentes à vida comunitária, de maneira informal e não explícita, permitindo uma afirmação positiva da identidade dos membros de um grupo social. Essa transmissão internalizada, que se desenvolve sob formas diversas, proporciona um sentimento de pertencimento, ampliando-se gradualmente à medida que se alarga a experiência do educando. Jovens e crianças reproduzem/recriam, em sua experiência cotidiana, na vida familiar e nas celebrações grupais, esses valores que são passados de geração a geração.
Em suas múltiplas variedades, o saber que se condensa nas culturas populares é um importante fator de afirmação da identidade do homem brasileiro, porque carrega consigo a memória de uma parte significativa da história deste país. No entanto, reduzido à condição de folclore (com toda a carga pejorativa que o termo traz em si), torna-se praticamente impossível levá-lo em conta, perdendo-se grande oportunidade de aproximação da realidade do país com o que se ensina na escola.
Os produtos resultantes de trabalhos de pesquisa (vídeos, publicações, áudio-visuais, etc.), assim como inúmeros outros materiais existentes e pouco divulgados – a exemplo dos trabalhos da FUNARTE (Fundação Nacional de Arte do Ministério da Cultura) – poderiam ser utilizados com proveito nas escolas, com o objetivo de levar os professores a ter uma visão mais abrangente da sociedade e da cultura brasileira e, portanto, uma visão crítica da escola atual. Instigar e informar os mestres quanto à sua história e à sua identidade é um começo de caminho para se mudar o panorama educacional. Os professores precisariam se reconhecer no que ensinam, conscientizando-se da formação pluriétnica do povo brasileiro e aceitando suas próprias origens, para que pudessem ensejar um processo educativo na escola mais adaptado à realidade nacional, levando os alunos a também desenvolver uma atitude afirmativa com relação à sua própria identidade.
BUSCANDO CAMINHOS NAS TRADIÇÕES
Helena Theodoro Mestre em Educação da Faculdade de Educação da UFRJ. Doutora em Filosofia, pela Universidade Gama Filho.
A população afro-descendente no Brasil tem características culturais muito marcantes, que precisam ser mais estudadas e entendidas já que a contribuição dos inúmeros países africanos é muito significativa para todos os setores da vida brasileira, quer se relacione à linguagem, à vida familiar, ao sistema simbólico, à comunidade religiosa, à produção do saber (Ciência) ou à transmissão do saber (Educação).
Linguagem e vida. As etnias trazidas para o Brasil, provenientes de diferentes regiões de África, com diversas línguas e culturas, são: os nagôs – provenientes da Nigéria, do Benin e do Togo, de língua iorubá . os fons ou minas – provenientes do antigo Daomé, atual Benin, de língua jeje . os bantos – provenientes de vários países – Angola, Congo, Moçambique, Zimbábue, etc. – de língua banta.
Procure contos africanos, lendas e mitos que demonstrem a luta social e a consciência cultural da problemática brasileira, já que temos a ordem cultural branca de um lado e a ordem cultural negra de outro.
A literatura atua em nossas vidas para unir os mitos fundamentais da comunidade, de seu imaginário ou de sua ideologia. Na literatura brasileira, no entanto, o negro é a palavra excluída, ocultada com frequência, ou uma representação inventada pelo outro, sendo sempre o elemento marginal.
As máscaras têm grande importância na vida religiosa, social e política da comunidade, mostrando diferentes categorias de mulher: mulher secreta – ligada ao divino, serve como passagem e receptáculo do sagrado no mundo dos vivos, por gerar frutos. .
mulher símbolo político – não usa violência para resolver as questões, aglutinando as pessoas, vivendo o cotidiano. .
mulher sagrada – símbolo de todos os tempos, pois está voltada para o futuro, sempre vulnerável e frágil, mas é aquela que abre o céu (orum) e deixa lugar para a mudança, para a transformação, o futuro.
As mulheres cantam, rezam e dançam, mostrando sua integração com o cosmos, já que a terra está em movimento, o universo está em movimento e eu só conseguirei estar em sintonia com o universo através do movimento.
Nesta cultura se busca acumular pessoas, criar laços e alicerçar amizades! Os mitos sobre os orixás, as histórias sobre valores da comunidade, envolvendo animais, crianças e adultos, bem como os toques de atabaques, baterias de escolas de samba, o bumba-meu-boi , os blocos afros, o frevo, a congada e muitas outras formas de festejos e danças, revelam força de vida, contam como são os orixás – nossa essência mais profunda – falando dos heróis da comunidade, ensinando amizade, perdão, responsabilidade e identidade cultural a todo um grupo de brasileiros, que só aprendeu a ter vergonha de suas raízes.
PERSONAGENS NEGROS: UM BREVE PERFIL NA LITERATURA INFANTO- JUVENIL
Heloisa Pires Lima Bacharel em Psicologia pela PUC. Mestrado em Antropologia Social pela USP
Mas, afinal de contas, o que é uma literatura infanto-juvenil? Enquanto tradição ocidental, esse tipo de livro surge como material auxiliar para educadores e adquire formato singular. Com a tríade livros pequenos / leitores crianças / personagens adaptados para a infância trabalham-se idéias, conceitos e emoções. Na clássica expressão de Jaqueline Held dedicada aos estudos sobre esse campo, “é a passagem do mundo da leitura para a leitura do mundo”.
Geralmente, quando personagens negros entram nas histórias aparecem vinculados à escravidão. As abordagens naturalizam o sofrimento e reforçam a associação com a dor. As histórias tristes são mantenedoras da marca da condição de inferiorizados pela qual a humanidade negra passou. Cristalizar a imagem do estado de escravo torna-se uma das formas mais eficazes de violência simbólica. Reproduzi-la intensamente marca, numa única referência, toda a população negra, naturalizando-se, assim, uma inferiorização datada. A eficácia dessa mensagem, especialmente na formatação brasileira, parece auxiliar no prolongamento de uma dominação social real. O modelo repetido marca a população como perdedora e atrapalha uma ampliação dos papéis sociais pela proximidade com essa caracterização, que embrulha noções de atraso.
Bem, tais exemplos podem iniciar pesquisas mais sistemáticas. Porém, com este artigo, pretende-se provocar uma postura mais crítica frente a esse universo difundido no Brasil para nossas crianças. Por outro lado, há também uma infinidade de representações mais respeitosas, que contribuem para um comportamento que integra, mais adequadamente, a população negra nos reinos infanto-juvenis. Mas, isto é uma outra história!
CONSTRUINDO A AUTO-ESTIMA DA CRIANÇA NEGRA
Inaldete Pinheiro de Andrade Educadora do Centro Solano Trindade. Mestre em Serviço Social.
Passado.Eu sou da geração da história de Trancoso: as mulheres mais velhas contando as histórias e a criançada em volta delas, corações palpitando para ouvir o “Era uma vez...”; era mais uma história iniciada. Lembro da Moura Torta, a velha invejosa; a Gata Borralheira e a madrasta (a fama que ficou para as madrastas não é das melhores); a menina que foi enterrada viva e os seus cabelos transformaram-se em capim que cresceu no quintal, denunciando a maldade do pai, o agressor. Eram muitas histórias e noutras noites pedíamos bis, não nos cansávamos, nem as mulheres contadoras: mamãe, Baía, a velha parteira e outras vizinhas que gozavam de lugar cativo nas noites em volta da mesa no terreiro, extensão da casa. Depois, o tempo dos livros; agora, já vinham como presente e a leitura era da minha responsabilidade. O fascínio de ouvir as histórias não fora perdido com as demais leituras, que foram incorporadas às atividades do meu cotidiano.
O presente.Hoje, já não há a roda em volta da mesa e o terreiro como extensão casa; só os terreiros religiosos, que continuam agregando a família negra, multiplicando-se em várias famílias, pais e mães-de-santo, filhos e filhas em lugares diversos. O “em volta da mesa” foi lentamente substituído pela televisão e outras histórias foram introduzidas no cotidiano das crianças, com o plágio de fadas no ar ao vivo por três a quatro horas consecutivas, diariamente, com músicas, desenhos animados e brincadeiras distantes do ambiente da maioria das crianças brasileiras- Uma amostra perversa para a construção de referência deste segmento.
A metodologia exige escolher a obra de acordo com a faixa etária e nível de leitura do grupo. Pede para se fazer a leitura individual ou coletiva, de acordo com a disposição do grupo ou do(a) facilitador(a). Finda a leitura, faz-se a análise, estimulando a expressão da turma que pode ser oral ou em desenho, dependendo de como a pessoa ou grupo queira expressar-se (vivi a ocasião em que o silêncio foi a forma de interpretação de algumas pessoas). Nas interpretações é possível apreender a manifestação da identidade racial, problema do grupo participante. Feita a exposição, fazem-se as observações necessárias, situando o presente para projetar o futuro com o estímulo à promoção da auto-estima da criançada.
Outros temas podem também ser discutidos com a mesma metodologia, como a questão indígena, a ecologia, o gênero, a sexualidade. A oferta do material produzido atende às minhas necessidades de facilitadora da Oficina, é só passar um tempo nas livrarias e/ou biblioteca.
Uma Oficina é um momento de reflexão que deve ser bem conduzida pelo(a) facilitador(a), de modo que as crianças saiam dela fortalecidas – e não envergonhadas, brancas ou negras – para continuar uma convivência onde os estereótipos consigam ser corrigidos e ambos os grupos vivam com mais saúde, livres do racismo, já que o racismo destrói quem o manifesta e quem é vítima
AS ARTES E A DIVERSIDADE ÉTNICO-CULTURAL NA ESCOLA BÁSICA
Maria José Lopes da Silva Graduada em Letras pela UFRJ Mestre em Linguística pela UFRJ
Trabalhando com a diversidade em artes, na escola fundamental,as normas estéticas variam muito de acordo com o lugar e a época. Por exemplo, na Europa Ocidental, os ideais estéticos da Renascença eram muito diferentes das concepções estéticas de sociedades não européias da mesma época. Vê-se, então, que a linguagem artística só tem um caráter “universal” se conhecemos os contextos histórico e sociocultural nos quais uma determinada obra foi produzida ou se, pelo menos, estamos abertos para esquecer por algum tempo os critérios que aprendemos com os nossos antepassados.
O próprio estudioso francês Roger Bastide, que durante alguns lecionou na USP, assim se pronunciou: “a arte afro-brasileira é uma arte viva, não estereotipada. Mas na sua evolução até as últimas transformações, ela vem preservando as estruturas tanto mentais como puramente estéticas da África”. No entanto, nos dias atuais, o preconceito dominante ainda vê o artista negro brasileiro como “primitivo” e “naïf” (ingênuo); é grande a barreira que o artista plástico negro encontra para impor-se no mercado brasileiro. O aluno já vem para a escola com um potencial criativo; a escola não precisa induzi-lo, sua função é trabalhá-lo. Sabemos que o currículo do Ensino Fundamental se compõe de 8 ciclos. Então, é importante que no 1º e no 2º ciclos a aprendizagem seja expressamente lúdica e leve os alunos à descoberta e à construção do seu saber.
Para tal, deve-se ter em mente as seguintes Orientações Gerais, nos oito ciclos da Escola Fundamental, o que inclui as modalidades artísticas específicas:
• Relativizar o conceito do “Belo”
• Relativizar o conceito de “Arte”;
• Reconhecer a África como uma das matrizes legítimas da cultura humana, em geral, e da brasileira, em particular, sem fazer referência apenas à permanência de algumas “marcas” restritas à esfera da música, da dança, da comida, etc., e marcadas por seu “exotismo”.
Por outro lado, penso que haveria alguns Conteúdos relativos a Valores, Normas e Atitudes, também propostos para serem trabalhados de primeira à oitava séries, em Artes, incluindo as formas artísticas específicas:
• Percepção, por meio de diferentes modalidades artísticas, de que cada pessoa tem um corpo com características fenotípicas diferentes;
• Valorização da própria identidade étnica e cultural e fortalecimento da auto-estima;
• Identificação enquanto pessoa no grupo;
• Interiorização de uma postura despreconceituada em relação às diferentes cosmovisões e etnias;
• Desenvolvimento de uma dimensão específica do aspecto estético das culturas africanas e afro-brasileiras;
• Reintegração do universo cultural, estético e simbólico das culturas africanas e afro-brasileiras no contexto da ancestralidade brasileira.
É de fundamental importância que, em qualquer série em que o aluno esteja, se valorize a sua auto-estima, ou seja, que o aluno construa. O educador deve estar atento no sentido de não trazer coisas prontas para o educando, tirando, com isso, todo o seu potencial criativo. Daí o papel das Artes Visuais no Ensino de 1º Grau, não desvinculando a vida ativa do aluno e a escola.
No Brasil, devido às necessidades do próprio culto, esses aspectos foram recriados justamente nos terreiros de Candomblé, gerando, assim, intensa atividade artística. As artes e a diversidade étnico-cultural na escola básica. O belo, na concepção africana, tem um valor utilitário, e não simplesmente estético. Os objetos têm uma finalidade e uma função, que vão além da mera representação material. Do mesmo modo, na escultura, as máscaras não são esculpidas para serem contempladas como obras de arte, mas para serem usadas por ocasião de cerimônias rituais, sociais e religiosas.
A manifestação mais antiga no domínio do canto, que é a melopéia, revive no Brasil através dos gritos modulados para chamar o gado; pregões dos vendedores ambulantes; cantos de trabalho antes denominados “vissungos”; cantos de engenho, etc.
EDUCAÇÃO E RELAÇÕES RACIAIS: REFLETINDO SOBRE ALGUMAS ESTRATÉGIAS DE ATUAÇÃO Nilma Lino Gomes Professora Assistente do Departamento de Administração Escolar da Faculdade de Educação da UFMG. Doutoranda em Antropologia Social/USP
Gostaria de iniciar esse artigo relembrando um documentário muito interessante intitulado Olhos Azuis1 , que vale a pena ser visto. Esse documento relata a experiência da sra. Jane Eliot, professora e psicóloga branca nos EUA, que organiza e desenvolve um workshop com pessoas de diferentes grupos étnico/raciais para discutir sobre o racismo e seus desdobramentos. Mas por que uma mulher branca nos EUA, poderia se interessar em desenvolver um trabalho como esse? De acordo com o documentário:
Concluíram, a partir daquela experiência, que não se deve julgar e maltratar as pessoas simplesmente porque nasceram com a cor dos olhos diferente umas das outras. A cor dos olhos em nada interfere no caráter, na personalidade e na capacidade das pessoas e nem deveria ser um critério para que alguns grupos humanos fossem tratados de maneira desigual em relação aos outros. Explicou, também, a atuação de Martin Luther King na luta pelos direitos civis, pela superação do racismo e o tanto que ele e outros ativistas negros incomodavam a ordem racista que imperava refletindo sobre algumas estratégias de atuação sociedade norte-americana da época. Assim, ela também pôde explicar por que esse grande líder negro havia sido assassinado.
Que atitudes tomamos frente às situações de discriminação racial no interior da escola e da sala de aula? Até quando esperaremos uma situação drástica de conflito racial ou enfrentamento para respondermos a essas perguntas? Por que será que a questão racial ainda encontra tanta dificuldade para entrar na escola e na formação do professorado brasileiro? Ainda encontramos muitos (as) educadores (as) que pensam que discutir sobre relações raciais não é tarefa da educação. É um dever dos militantes políticos, dos sociólogos e antropólogos. Tal argumento demonstra uma total incompreensão sobre a formação histórica e cultural da sociedade brasileira.
Muitos professores ainda pensam que o racismo se restringe à realidade dos EUA, ao nazismo de Hitler e ao extinto regime do Apartheid na África do Sul. Esse tipo de argumento é muito usado para explicar a suposta inexistência do racismo no Brasil e ajuda a reforçar a ambiguidade do racismo brasileiro. Além de demonstrar um profundo desconhecimento histórico e conceptual sobre a questão, esse argumento nos revela os efeitos do mito da democracia racial na sociedade brasileira, esse tão falado mito que nos leva a pensar que vivemos em um paraíso racial.
Que tipo de profissionais temos sido? A educação carece de princípios éticos que orientem a prática pedagógica e a sua relação com a questão racial na escola e na sala de aula.
Significa perguntar até que ponto, em nome de uma suposta autonomia, uma professora pode colocar uma criança negra para dançar com um pau de vassoura durante uma festa junina porque nenhum coleguinha queria dançar com um “negrinho”. Discutir essa “autonomia” do professor representa, também, denunciar práticas em que o (a) professor(a) estabelece que o castigo para os alunos “desobedientes” será sentar ao lado do aluno negro da sala.
É preciso que as práticas pedagógicas sejam orientadas por princípios éticos que norteiem as relações estabelecidas entre professores, pais e alunos no interior das escolas brasileiras.
E, por último, penso que todo(a) educador(a), ao trabalhar com a questão racial, deveria tomar conhecimento das lutas, demandas e conquistas do Movimento Negro. Não podemos nos esquecer de que a inclusão da temática racional na escola brasileira e o reconhecimento a sua inclusão no currículo deve muito à atuação desse movimento.
APRENDIZAGEM E ENSINO DAS AFRICANIDADES BRASILEIRAS1 Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva Doutora em Ciências Humanas - Educação. Docente do Departamento de Metodologia do Ensino da Universidade Federal de São Carlos. Participante da Coordenação do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros desta Universidade
“A grande tarefa no campo da educação há de ser a busca de caminhos e métodos para rever o que se ensina e como se ensinam, nas escolas públicas e privadas, as questões que dizem respeito ao mundo da comunidade negra. A educação é um campo com sequelas profundas de racismo, para não dizer o veículo de comunicação da ideologia branca(Rocha, 1998, p. 56).
Ao dizer africanidades brasileiras estamos nos referindo às raízes da cultura brasileira que têm origem africana. Dizendo de outra forma, estamos, de um lado, nos referindo aos modos de ser, de viver, de organizar suas lutas, próprios dos negros brasileiros, e de outro lado, às marcas da cultura africana que, independentemente da origem étnica de cada brasileiro, fazem parte do seu dia-a-dia.
Reivindicamos, nós afro-brasileiros, o estudo das Africanidades com o propósito de que os currículos escolares, em todos os níveis de ensino:
• valorizem igualmente as diferentes e diversificadas raízes das identidades dos distintos grupos que constituem o povo brasileiro;
• busquem compreender e ensinem a respeitar diferentes modos de ser, viver, conviver e pensar;
• discutam as relações étnicas, no Brasil, e analisem a perversidade da assim designada “democracia racial”;
• encontrem formas de levar a refazer concepções relativas à população negra, forjadas com base em preconceitos, que subestimam sua capacidade de realizar e de participar da sociedade, material e intelectualmente;
• identifiquem e ensinem a manusear fontes em que se encontram registros de como os descendentes de africanos vêm, nos quase 500 anos de Brasil, construindo suas vidas e sua história, no interior do seu grupo étnico e no convívio com outro grupos;
• permitam aprender a respeitar as expressões culturais negras que, juntamente com outras de diferentes raízes étnicas, compõem a história e a vida de nosso país;
• situem histórica e socialmente as produções de origem e/ou influência africana, no Brasil, e proponham instrumentos para que sejam analisadas e criticamente valorizadas. Firmados os objetivos do estudo dos Africanidades Brasileira é preciso que se pesem procedimentos convenientes para conduzir tal estudo.
A GEOGRAFIA, A ÁFRICA E OS NEGROS BRASILEIROS.
Rafael Sanzio Araújo dos Anjos Professor Adjunto 2 do Departamento de Geografia da Universidade de Brasília.
“A grande aspiração do negro brasileiro é ser tratado como um homem comum” (Milton Santos, 1995)
O sistema escolar tem sido estruturado para a perpetuação de uma ideologia sócio-político-econômica que, junto com os meios de comunicação social, mantém uma estrutura classista, transmissora de valores distorcidos e individualistas. Primeiro, são os livros didáticos, que ignoram o negro brasileiro e o povo africano como agente ativo da formação geográfica e histórica. Em segundo, a escola tem funcionado como uma espécie de segregadora informal. A ideologia subjacente a essa prática de ocultação e distorção das comunidades afro-descendentes e seus valores tem como objetivo não oferecer modelos relevantes que ajudem a construir uma auto-imagem positiva, nem dar referência à sua verdadeira territorialidade e sua história (ANJOS, 1989).
Não podemos perder de vista que muitos materiais didáticos têm desempenhado um papel muitas vezes decisivo na introjeção de conceitos errados, de forma velada ou explícita, assim como de estereótipos. Vejamos alguns exemplos: não se pode mais aceitar a difusão da escravidão como fato que se associa exclusivamente aos povos africanos, nem tampouco imagens do negro apenas como escravos ou no desempenho de atividades na sociedade sem prestígio; de não inserir devidamente o papel do negro brasileiro nos ciclos econômicos do país; de não revelar o contingente populacional de afro-descendentes atual no Brasil e sua importância; enfatizar que os africanos e seus descendentes são, também, responsáveis pela adequação aos trópicos da tecnologia pré-capitalista brasileira, como a mineração, a medicina, a nutrição e a agricultura; que a herança cultural trazida da África constitui a matriz mais importante da cultura popular brasileira e que é frequentemente relegada pela ideologia dominante ao folclore.
Nesse sentido, sugerimos alguns eixos temáticos para serem trabalhados na disciplina Geografia do Brasil e que podem ter um tratamento dentro de uma perspectiva de valorização da pluralidade cultural. Os eixos são os seguintes:
1-A formação do território colonial brasileiro;
2- Os ciclos econômicos e o tráfico de povos africanos;
3- A organização territorial do Brasil nos séculos XVI, XVII, XVIII e XIX;
4- A estrutura e a dinâmica da população brasileira;
5- Os grupos étnicos, as densidades, o nível de vida e os contextos socioeconômicos; 6- A organização territorial atual do país;
7- O Brasil urbano e os afro-descendentes;
8- O Brasil rural e os remanescentes de quilombos.
RACISMO, PRECONCEITO E DISCRIMINAÇÃO
Procedimentos didático-pedagógicos e a conquista de novos comportamentos Véra Neusa Lopes Professora e Técnica em Educação do Estado do Rio Grande do Sul. Bacharel e licenciada em Ciências Sociais, com especialização em Planejamento da Educação. Assessora dos Agentes de Pastoral Negros/Rio Grande do Sul, para Assuntos de Planejamento na Área da Educação.
Considerações iniciais. A educação escolar, de caráter obrigatório, prevista nas leis de ensino vigentes, deve:
a) caracterizar-se como processo de desenvolvimento do indivíduo – dinâmico, em permanente transformação e atualização – identificando, portanto, um modelo educacional não fechado, receptivo às mudanças que ocorrem na sociedade e que, conseqüentemente, se refletem na escola (microsistema) e nela interferem;
b) propor o conhecimento como processo de aproximações e produto de construções sucessivas, a partir da realidade, como resultado do diálogo permanente estabelecido entre os sujeitos, em razão do objeto de aprendizagem, numa ação contínua de troca e ampliação dos saberes. Isto significa que não há conhecimento acabado, pronto e que sempre, ao longo da vida, da qual o tempo escolar é apenas um dos segmentos, o homem tem oportunidades variadas de realizar aprendizagens que se expandem e que se completam, tendo o real como base a partir do qual as aprendizagens acontecem e o diálogo como estratégia principal de sustentação dessas aprendizagens;
c) preocupar-se em colocar o professor na obrigação de romper com o papel que, tradicionalmente, tem assumido – de reprodutor de conhecimento – levando-o a uma nova postura de agilizador da produção de conhecimento em parceria com seus alunos e a comunidade, na construção coletiva do saber, o que se traduz pelo processo de ajuda mútua que deve estabelecer-se entre professor e aluno; d) entender e colocar o aluno como centro do processo educativo, transformando-o, efetivamente, em sujeito do conhecimento construído/ produzido, sendo aquele que, com o apoio do professor, aporta novos saberes aos que já detém, invalidando a idéia de que o aluno aprende porque o professor ensina.
O combate ao racismo, ao preconceito e à discriminação, em nível escolar, deve tomar as mais diferentes formas de valorização da pessoa humana, povos e nações, valorização que se alcança quando descobrimos que as pessoas, mesmo com suas dessemelhanças, ainda são iguais entre si e iguais a nós, com direito de acesso aos bens e serviços de que a sociedade dispõe, de usufrui-los, criar outros, bem como de exercer seus deveres em benefício próprio e dos demais.
Para Valente:
a) preconceito racial é ideia preconcebida suspeita de intolerância e aversão de uma raça em relação a outra, sem razão objetiva ou refletida. Normalmente, o preconceito vem acompanhado de uma atitude discriminatória;
b) discriminação racial é atitude ou ação de distinguir, separar as raças, tendo por base idéias preconceituosas.
O Programa Nacional de Direitos Humanos considera o preconceito como atitude, fenômeno intergrupal, dirigido a pessoas ou grupos de pessoas; é predisposição negativa contra alguém; algo sempre ruim: predisposição negativa, hostil, frente a outro ser humano; desvalorização do outro como pessoa, considerado indigno de convivência no mesmo espaço, excluído moralmente.
A proposta pedagógica deve voltar-se, assim, para um trabalho continuado de valorização das pessoas, povos e nações, num combate permanente às ideias preconcebidas e às situações de racismo e discriminação com que nos defrontamos no dia-a-dia.
Referência bibliográfica: Superando o Racismo na escola. 2ª edição revisada / Kabengele Munanga, organizador. – [Brasília]: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, 2005. 204p.: il. 1. Discriminação Racial. 2. Ideologia dos livros didáticos I. Munanga Kabengele. CDU 323.12 371.671.1
Importante: Em 2003, a Lei 10.639 alterou a LDB (lei 9.394/96) para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade do estudo da história e cultura afro-brasileira. No ano de 2008, a Lei 11.645 alterou novamente a LBD para incluir no currículo a obrigatoriedade do estudo da história e cultura dos povos indígenas. Assim, a legislação passou a exigir a inclusão no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade do estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena. Seguem abaixo as partes principais das leis 10.639 e 11.645: http://temasdaeducacao.blogspot.com.br/2010/03/lei-10639-de-9-de-janeiro-de-2003.html
CONTRIBUIÇÃO AO DEBATE, ABRIL DE 2016. PROFESSOR ALDO SANTOS.
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